quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

"ANENCEFALIA, DIREITO & ESTADO", POR JOÃO BAPTISTA VILLELA


O erudito João Baptista Villela, Professor Titular de Direito Civil na Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, autor de "Malformações, Viabilidade e Aborto: Retorno de um Espectro?", Repertório IOB de Jurisprudência, São Paulo, n. 24/94, 2. quinz. dez. 1994, cad. 3:479-475, concedeu entrevista memorável à jornalista Andréia Rocha, do Boletim do IBDFAM, e apenas parcialmente publicada, sob o título "Entre Convicções e Interpretações", na edição n.º 31, março/abril de 2005, p. 9, daquele periódico, que se edita em Belo Horizonte. O texto foi reproduzido no livro: "Direito Fundamental à Vida", São Paulo: Quartier Latin, Centro de Extensão Universitária, 2005, coordenado por Ives Gandra da Silva Martins.

O texto deixa claras a profundidade e a lucidez incomuns do grande civilista, jurista de primeira grandeza, bem como a sua notória capacidade de desfazer sofismas, lugares comuns, falsos esquemas mentais, chavões e pseudo-argumentos acolhidos sem maiores reflexões. Trago alguns excertos:

"A dignidade da pessoa humana, de que tanto se fala, mas de que tão pouco se entende, é incompatível com qualquer distinção entre pessoas, para lhes dar mais ou menos direitos. Crianças, adultos, jovens e anciãos, homens e mulheres, virtuosos e delinquentes, sãos e enfermos - todos têm a mesma dignidade perante o direito, porque todos são pessoas. Ora, segundo esta lógica inerente aos direitos humanos, tampouco se pode distinguir entre os que têm cérebros completos e os que os têm incompletos ou simplesmente não os têm. A Constituição não protege a vida humana dos que têm cérebros ou dos que têm braços ou dos que têm fígado ou dos que têm rins. Ela protege a 'vida humana', simplesmente.
 
[...]
 
A mãe, claro, participa da mesma dignidade do filho. Nem mais nem menos. Por isso seria inadmissível - falo de uma gravidez qualquer - sacrificar a vida da mãe para salvar a do filho. O aborto do anencéfalo não prolonga sua vida. Ao contrário, elimina o pouco de vida que ele teria. De modo que a dor da mãe, de levar a termo a gravidez de um filho que terá vida breve, não é necessariamente maior que a dor da mãe de gerar um filho que não conhecerá a luz do mundo.
 
[...]
 
O 'moral' e o 'legal' não são conceitos que se repelem. Ao contrário. Embora não se superponham, eles se interpenetram. Nem tudo que é prescrito pela moral é também prescrito pelo direito. Mas tudo que é legal exprime alguma forma de moralidade. Todas as ações humanas estão permeadas pela moral. Assim, um direito 'amoral' não seria um direito para seres humanos.
 
[...]
 
Proteger a vida humana, onde quer que ela se manifeste, dentro ou fora de um útero, não é uma interferência. Ou, se se quiser, é uma interferência necessária. Portanto, não excessiva. Neste sentido tanto é interferência tutelar a gravidez de um anencéfalo como cobrar impostos, varrer as ruas, prender os assaltantes ou processar criminalmente um administrador corrupto. Todas essas ações constituem deveres do Estado.
 
[...]
 
[...] Conduzir com empenho e responsabilidade qualquer gravidez a seu termo é um dever elementar da mulher, de que a engravidou, da sociedade e do Estado. A manutenção de uma gravidez independe das características somáticas do feto. [...] Ora, aí estaríamos fazendo uma diferença entre os que têm uma sobrevida longa e os que têm uma sobrevida curta. Esta distinção é inaceitável. Uma criança cheia de vida, que acaba de nascer, com um futuro de saúde promissor, vale tanto par ao direito quanto um ancião moribundo à beira da morte. Isto é o que se chama 'dignidade da pessoa humana'. Não fosse assim, deveríamos falar em dignidade 'dos jovens', 'dos saudáveis', 'dos que não padecem deficiência', etc. e não em 'dignidade da pessoa humana'. Por este motivo é que quem atenta contra a vida de um bebê está sujeito às mesmas penas que quem atenta contra a vida de um ancião. O direito não protege a duração da vida, senão a vida mesma pelo tempo - longo ou breve - que durar.
 
[...]
 
Uma coisa deve ficar bem clara no debate sobre o aborto. Não é o feto, seja ele anencéfalo ou não, que pediu para ser gerado. Uma vez gerado, pouco importa sob que condições, ele passa a ter a proteção do Estado, como se já tivesse nascido. Ninguém tem mais direito sobre a sua vida. Isto é norma expressa do Código Civil, que não quer saber se o feto goza de boa saúde, se foi concebido por estupro, por incesto ou no sacrossanto recesso de um casto matrimônio. Não vejo razão para ser diferente. Portanto, penso que a legislação que impede a interrupção da gravidez só deve ser mudada para não comportar exceção de qualquer espécie.
 
[...]
 
Não há opinião 'estritamente técnica', porque o direito não comporta leitura neutra. Toda interpretação carrega a visão de mundo do agente que a pratica. Mas também não direi que se trata de uma 'opinião pessoal'. O que estou dizendo resulta de regras positivas permeadas pelos valores que informam a cultura jurídica brasileira, particularmente os inscritos na Constituição da República. Convém, entretanto, acrescentar que também não se trata de uma opinião religiosa. A este propósito grassa hoje um enorme equívoco na discussão do tema. [...]
 
[...]
 
Pergunta: O senhor acredita que teria essa mesma posição caso fosse mulher e, ainda, se estivesse gerando um ser com nenhuma possibilidade de sobrevida?
 
Resposta: Uma posição de princípio só é consistente se consegue ultrapassar os limites da experiência pessoal. Portanto, mais uma vez, não é a história de cada um que lhe deve incutir as convicções. São as convicções que determinam sua conduta em cada situação concreta.

[...]

[...] Mas a ausência de viabilidade, como tal, não justifica a eliminação antecipada da vida. Nem constitui impedimento à aquisição plena da personalidade civil. No passado debateu-se muito essa questão: Se a personalidade do homem resulta só do nascimento com vida, ou se ao nascimento haveria de acrescentar-se a condição de viabilidade. Quando da discussão do Código Civil de 1916, Azevedo Marques chegou a propor, para maior segurança, que o Código declarasse expressamente não ser a viabilidade requisito da personalidade civil. Considerou-se desnecessário fazê-lo. E com isso ficamos livre de ter no Código a desconfortável advertência. Não apenas ociosa, mas constrangedora. O critério de viabilidade não só é cientificamente discutível como diz respeito à vida futura. Ora, o direito não exige a vida subsequente para assegurar proteção à vida atual. Onde está presente a vida humana, aí deve estar presente a tutela do direito. Pouco importa a duração. Hitler, é certo, não pensava assim. No seu livro 'Mein Kampf' dizia que, se faltam forças para lutar pela vida - e é nisso que consiste a inviabilidade -, cessa o próprio direito à vida. Felizmente as ideias do 'Führer' são um pesadelo de que a humanidade se livrou. Para sempre, espero."
 

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

6.º ANIVERSÁRIO DO GRUPO DO ROSÁRIO




Transcorreu muito bem o 6.º aniversário do Grupo do Rosário, do rosário da Catedral de Nossa Senhora da Boa Viagem, em Belo Horizonte. Junto à cátedra do arcebispo e, em especial, pelo bem espiritual de nossa arquidiocese, há seis anos ininterruptos rezamos todos os sábados, sem exceção, o rosário completo. É uma grande graça de Deus. Agradecemos a presença de todos. Foi uma manhã muito alegre!
 
 
 
 
Neste ano de 2016, se Deus quiser, faremos como sempre a nossa romaria a São João del-Rei em honra de Nossa Senhora do Rosário, no mês de outubro, com a finalidade também de encontrarmo-nos com os nossos irmãos da Venerável Confraria de Nossa Senhora do Rosário de São João del-Rei, a mais antiga irmandade de Minas Gerais, fundada em 1708.
 
 
 
 
Permitindo Deus, faremos também neste ano: o Pequeno Cerco de Jericó, de 1.º a 7.º de maio, com a recitação diária do rosário completo diante do Santíssimo exposto, em igreja ainda a ser definida. Provavelmente, na Boa Viagem ou na Igreja do Carmo, do Carmo-Sion.
 
 

  
Em julho, promoveremos uma campanha de imposições do escapulário, por ocasião da Festa de Nossa Senhora do Carmo, em 16 de julho.
  
 
 
 
Em agosto, em preparação ao grande dia do patriarca São Domingos de Gusmão, criador da oração do rosário e seu principal divulgador, faremos uma belíssima novena em sua honra, para bem celebrarmos a sua festa no dia 8 de agosto.
 
Rogai por nós, glorioso pai São Domingos.
 
Para que sejamos dignos das promessas de Cristo. Amém!
 
Paul Medeiros Krause

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

QUERO CONHECER MELHOR

De fontes variadas chegam-me informações importantes sobre três personalidades que pretendo conhecer melhor. Penso que valeria a pena a todos nós conhecê-los mais profundamente. São eles:
 
1.º) Dom Geraldo de Proença Sigaud, SVD, verbita, belorizontino de boa cepa, de família tradicional, já falecido, foi arcebispo de Diamantina, conservador, ferrenho combatedor do comunismo, autor de um "Catecismo Anticomunista" e de uma bela carta pastoral contra o comunismo, bastante crítico às posturas de Dom Hélder Câmara, diante de quem fez o contraponto, segundo consta, com bastante energia e competência, na imprensa e no Concílio Vaticano II. Fundador da TFP ("Tradição, Família e Propriedade"), da qual se afastou posteriormente, em razão do tradicionalismo exacerbado de Dom Antônio Castro Mayer e Plínio Corrêa de Oliveira, seus co-fundadores, que não aceitaram o Concílio Vaticano II;
 
2.º) Dom João Evangelista Martins Terra, S.J., jesuíta, teólogo e biblista de renome internacional, bispo auxiliar emérito de Brasília, trabalhou com Joseph Ratzinger na Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé (Pontifícia Comissão Bíblica), especialista em angeologia, com três doutorados, um deles sobre a "A Angeologia de Karl Rahner à luz dos seus princípios hermenêuticos", possui um site que não sei se está ativo: www.domterra.supralus.com. Tenho um livro seu muito interessante (ele escreveu mais de duzentos!) chamado "O itinerário teológico de Bento XVI";
 
3.º)  Francisco Javier Hervada Xiberta ou simplesmente Javier Hervada, jurista, filósofo e professor espanhol, ao que consta, grande defensor do realismo jurídico clássico, crítico ao positivismo normativista e ao pós-positivismo.
 
São benvindos comentários e informações adicionais.
 
Paul Krause 

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

6.º ANO DO ROSÁRIO DA CATEDRAL DA BOA VIAGEM


O Grupo do Rosário com a Confraria em São João del-Rei


Prezado amigo, prezada amiga,

Gostaria de convidá-lo para o 6.º aniversário do rosário da catedral. Foram 6 anos de recitação ininterrupta do rosário, dos quatro terços, durante todos os sábados de cada ano. Não houve um único sábado sem o rosário, nem mesmo em feriados ou férias. É uma grande graça de Deus, já que os tempos andam difíceis e a Mãe de Deus em suas aparições anda exigindo a reza do terço.

A comemoração será simples. Será rezando o rosário, como sempre fazemos. E no final distribuiremos aos presentes o livro "Teologia da Libertação", do Prof. Felipe Aquino, pois é necessário conhecermos o nosso pior inimigo, que vem devastando a Igreja e a sociedade brasileira.

Conto com a sua presença.

Convide os seus parentes e amigos. Caso você não possa ir, reze por nós de onde estiver e quando puder. Desde já incluímos você, as suas necessidades e intenções nas do rosário daquele dia.

Será no próximo dia 13/2/2016, sábado, às 9:00 horas da manhã, em frente à imagem de Nossa Senhora do Rosário de Fátima, do lado externo esquerdo da Catedral de Nossa Senhora da Boa Viagem em Belo Horizonte (MG).

Um grande abraço,

Paul

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

VISITA A GUSTAVO CORÇÃO


Gustavo Corção Braga



No dia 30 de janeiro, tive a alegria de visitar um amigo de longa data. Já erámos amigos, eu já havia lido as suas cartas, isto é, alguns de seus livros, mas nunca havíamos nos encontrado pessoalmente. Visitei o túmulo de Gustavo Corção Braga, o grande e destemido pensador católico, autor brasileiro da minha predileção, no Cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro.

Ao chegar, pedi informações à administração do cemitério. Disse que pretendia visitar o túmulo de um escritor e disse-lhe o nome. O funcionário abriu o livro dos mortos famosos, dos túmulos mais visitados. Advertiu-me que os túmulos mais procurados são os do Cazuza e da Marília Pêra. Modesto e avesso aos aplausos do mundo, Corção não estava ali. A pesquisa deveria seguir o método usual destinado aos reles mortais: a indicação da data do óbito ou do enterro e o nome completo do falecido. Não houve problema, pois eu dispunha de tais informações.

O número do jazigo chamou-me logo a atenção. Contém dois números que podem muito bem ser considerados “agostinianos”, por assim dizer. O “13” e o “430”. 13 porque Aurélio Agostinho, o célebre bispo de Hipona, nasceu em 13 de novembro de 354. “430” porque ele faleceu no ano 430. Tal coincidência, que poderia ter passado despercebida, não me escapou. E logo me dei conta de que o coração atormentado e ardente de Corção muito se assemelha ao  do grande africano, cuja conversão também fora intelectual, assim como a sua. A conversão de ambos foi a culminância de um percurso, de um caminho, de um trajeto intelectual de busca da verdade.

Mais ainda. Como Santo Agostinho, Corção possui as suas “Confissões”, “A descoberta do outro”. E a sua obra magna também é a sua “Cidade de Deus”, “Dois amores – duas cidades”, que, por sinal, parece uma continuação formidável do inigualável trabalho do doutor da Graça.

Como o eminente doutor da Igreja, Corção não prescinde da sinceridade, da espontaneidade e, ao mesmo tempo, do rigor da forma. Do esmerado cultivo da palavra, da arte de escrever. Não lhe parece suficiente transmitir a verdade ou o que lhe parecer ser a verdade. Importa-lhe fazê-lo com a máxima arte possível. Para ele, a beleza não é supérflua. E não deve ser mesmo, pois um russo já profetizou que a beleza salvará o mundo...

Encontrei, afinal, o túmulo simples e sóbrio de Corção, simples e sóbrio como ele próprio. Ali rezei o quinto mistério gozoso, o do reencontro de Nossa Senhora e de São José com o Menino Jesus ensinando aos doutores, no templo. Tenho hábito de meditar nos frutos de cada mistério do terço. O fruto que se costuma considerar no quinto gozoso é a sabedoria. Pois bem. Ali, diante do mestre, que não está morto, mas está vivo em Deus fruindo o merecido repouso da eternidade depois de tão árduos combates, de tão duras lutas, pedi a Deus e, por que não dizer, também a ele, a sabedoria. Ele que também ensinou a tantos e ainda ensina. Ele, esse grande amigo e apaixonado pela sabedoria.

Pedi também, amável leitor, a Deus Nosso Senhor que faça o país amadurecer e tornar-se capaz de identificar no meio dos escombros os seus verdadeiros heróis, os homens e mulheres representativos, que realmente edificaram a sociedade na rocha dos valores, que a sedimentaram na elevação do espírito, e ser-lhes eternamente grato. Pedi a Deus que cure os nossos olhos da cegueira, as nossas mentes da estultice e o nosso coração da ingratidão.
 
Paul Medeiros Krause