quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

VISITA A GUSTAVO CORÇÃO


Gustavo Corção Braga



No dia 30 de janeiro, tive a alegria de visitar um amigo de longa data. Já erámos amigos, eu já havia lido as suas cartas, isto é, alguns de seus livros, mas nunca havíamos nos encontrado pessoalmente. Visitei o túmulo de Gustavo Corção Braga, o grande e destemido pensador católico, autor brasileiro da minha predileção, no Cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro.

Ao chegar, pedi informações à administração do cemitério. Disse que pretendia visitar o túmulo de um escritor e disse-lhe o nome. O funcionário abriu o livro dos mortos famosos, dos túmulos mais visitados. Advertiu-me que os túmulos mais procurados são os do Cazuza e da Marília Pêra. Modesto e avesso aos aplausos do mundo, Corção não estava ali. A pesquisa deveria seguir o método usual destinado aos reles mortais: a indicação da data do óbito ou do enterro e o nome completo do falecido. Não houve problema, pois eu dispunha de tais informações.

O número do jazigo chamou-me logo a atenção. Contém dois números que podem muito bem ser considerados “agostinianos”, por assim dizer. O “13” e o “430”. 13 porque Aurélio Agostinho, o célebre bispo de Hipona, nasceu em 13 de novembro de 354. “430” porque ele faleceu no ano 430. Tal coincidência, que poderia ter passado despercebida, não me escapou. E logo me dei conta de que o coração atormentado e ardente de Corção muito se assemelha ao  do grande africano, cuja conversão também fora intelectual, assim como a sua. A conversão de ambos foi a culminância de um percurso, de um caminho, de um trajeto intelectual de busca da verdade.

Mais ainda. Como Santo Agostinho, Corção possui as suas “Confissões”, “A descoberta do outro”. E a sua obra magna também é a sua “Cidade de Deus”, “Dois amores – duas cidades”, que, por sinal, parece uma continuação formidável do inigualável trabalho do doutor da Graça.

Como o eminente doutor da Igreja, Corção não prescinde da sinceridade, da espontaneidade e, ao mesmo tempo, do rigor da forma. Do esmerado cultivo da palavra, da arte de escrever. Não lhe parece suficiente transmitir a verdade ou o que lhe parecer ser a verdade. Importa-lhe fazê-lo com a máxima arte possível. Para ele, a beleza não é supérflua. E não deve ser mesmo, pois um russo já profetizou que a beleza salvará o mundo...

Encontrei, afinal, o túmulo simples e sóbrio de Corção, simples e sóbrio como ele próprio. Ali rezei o quinto mistério gozoso, o do reencontro de Nossa Senhora e de São José com o Menino Jesus ensinando aos doutores, no templo. Tenho hábito de meditar nos frutos de cada mistério do terço. O fruto que se costuma considerar no quinto gozoso é a sabedoria. Pois bem. Ali, diante do mestre, que não está morto, mas está vivo em Deus fruindo o merecido repouso da eternidade depois de tão árduos combates, de tão duras lutas, pedi a Deus e, por que não dizer, também a ele, a sabedoria. Ele que também ensinou a tantos e ainda ensina. Ele, esse grande amigo e apaixonado pela sabedoria.

Pedi também, amável leitor, a Deus Nosso Senhor que faça o país amadurecer e tornar-se capaz de identificar no meio dos escombros os seus verdadeiros heróis, os homens e mulheres representativos, que realmente edificaram a sociedade na rocha dos valores, que a sedimentaram na elevação do espírito, e ser-lhes eternamente grato. Pedi a Deus que cure os nossos olhos da cegueira, as nossas mentes da estultice e o nosso coração da ingratidão.
 
Paul Medeiros Krause

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