terça-feira, 6 de novembro de 2018

"O OVO DA MINHOCA" E DUAS IMPRUDÊNCIAS

 
Quando estudei no Colégio Técnico da UFMG, o glorioso Coltec, fui editor, vamos dizer assim, do jornalzinho dos estudantes, com o magnífico nome de "O Ovo da Minhoca".
 
É com admiração que recordo que a minha integridade física foi preservada, mesmo diante de duas imprudências do editor e redator.
 
A primeira foi que certa vez inventei uma seção fictícia chamada "Troca-troca". Nessa seção pus um anúncio fictício mas com o nome real de um colega. O anúncio era assim: "Troco tevê preto e branco por gravata colorida." O colega veio tirar satisfações mas eu disse que foi uma homenagem e ficou por isso mesmo.
 
A segunda foi com outra seção, que plagiava escancaradamente o Millôr Fernandes.
 
No Coltec havia o curso técnico de "Instrumentação", não sei se ainda há, carinhosamente designado de "Instrumes".
 
Pois bem. Comecei a seção assim: "REFLEXÕES SEM ODOR, À moda dos estrumes da Instrumes".
 
Passei ileso. Tive sorte.
 
Nessa ocasião inventei ainda a seção do "Horóscopo Coltecano". Havia um signo em que as mulheres gostavam de usar cabelo e nariz grandes...
 

quinta-feira, 1 de novembro de 2018

TODOS OS SANTOS

"Todos os santos", Fra Angelico.

Hoje, no calendário litúrgico, é a Solenidade de Todos os Santos. No Brasil, a CNBB, com prévia aprovação da Santa Sé, transfere-a para o domingo seguinte.

É muito bonita essa festa. É a comemoração que abrange também todos os santos não canonizados, nossos amigos, nossos parentes, aqueles que conviveram conosco e que já vivem na glória do céu.

No dia 1.º de novembro, a Igreja inicia a semana dos mortos, que se estende até o dia 8 de novembro. Durante esses oito dias é possível lucrar uma indulgência plenária, exclusiva para os falecidos, mediante uma visita ao cemitério, rezando-se lá pelo menos um Credo e um Pai-Nosso, além do cumprimento das condições gerais: desapego de todo pecado, mesmo venial; estado de graça obtido antes do fim da visita ao cemitério; confissão individual, pelo menos 20 dias antes ou depois da visita; comunhão e oração pelas intenções do Papa (pelo menos, um Pai-Nosso e uma Ave-Maria).

A partir do meio-dia de hoje até às 24 horas de amanhã, a visita poderá ser a uma igreja paroquial, rezando-se lá pelo menos um Credo e um Pai-Nosso e cumprindo-se as condições gerais.

É um grande ato de caridade socorrer as almas do purgatório. Não nos esqueçamos delas. E não nos esqueçamos dos santos que conviveram conosco e que agora são nossos advogados, auxiliadores e intercessores no céu.

Todos os santos, rogai por nós!



sexta-feira, 7 de setembro de 2018

NOSSO LOUVOR A DEUS, COM UMA PÁGINA ESPLENDOROSA

 
Nesse 7 de setembro, nosso louvor de agradecimento a Deus e a Nossa Senhora, por terem livrado o Brasil do comunismo em 1964, por meio do maravilhoso e dócil instrumento dos soldados da terra, mar e ar, com uma página esplendorosa do mestre Corção, falecido há quarenta anos:
 
“Naquela manhã, à saída da missa, percebemos logo que a anormalidade chegara a um ponto decisivo. Antes mesmo de ver os lenços azuis, sentimos o ar de um dia diferente. O que faziam ali aqueles rapazes de lenço azul e revólver na cinta? Eram milicanos. O que é que se esperava? Um ataque ao palácio do Governador da Guanabara.
 
Esboçavam-se filas diante dos armazéns. A cidade inteira - advinhávamos - se preparava e se retesava. Caminhamos na direção do Palácio e encontramos amigos, homens pacíficos, negociantes e professores, que se dirigiam também ao Palácio, com um revólver surgido na cinta que jamais sonhara tamanha responsabilidade. O brasileiro bom, o brasileiro sem jeito, modesto, caminhava mansamente e sem ares de heroísmo para uma situação em que possivelmente teria de dar a vida. Povo manso, povo bom, pensava eu, mas também povo bobo e sem jeito. O que iria acontecer?
 
Numa esquina ouvi uma conversa entre dois populares:
 
- Parece que os tanques vão atacar o Palácio pela Rua Passandu.
 
- Não pode. Ô cara, você não sabe que é contra-mão?
 
Perto do Palácio adensava-se a multidão, mas no meio dos homens canhestramente dispostos a dar a vida pela Pátria passavam meninos de bicicleta e moças risonhas e despreocupadas. Seria da mocidade, desta bateria nova e bem carregada, que eles tiram tamanha energia? Não. O povo todo, observando melhor, ostentava uma graciosa e leve coragem. Uma coragem humorística. E eu tive, de repente, a intuição viva e fulgurante da vitória desse gênio brasileiro contra a substância que o ameaçava.
 
Pouco depois chegou a primeira onda de notícias surpreendentes: os tanques tinham aderido ao Governador, as Forças Armadas dominavam a situação, João Goulart fugira do Palácio das Laranjeiras, sem tempo de meter a fralda da camisa para dentro das calças. Pouco tempo depois confirmava-se a notícia, e o povo brasileiro (com exceção dos intelectuais de esquerda e dos eclesiásticos paracomunistas) ficou sabendo que Nossa Senhora ouvira nossas súplicas, que Deus nos salvara e que o instrumento escolhido para este milagre fora o nosso bom soldado da terra, mar e ar.
 
 
Dois dias depois, em todas as cidades grandes do Brasil, o povo encheu as ruas com a Marcha da Família - com Deus pela Liberdade. Eu e quatro amigos estivemos perdidos, imersos na mais densa multidão que jamais víramos reunida. Ali estava o que os intelectuais de esquerda chamavam o antipovo. Ali estava o sangue vivo de nosso bom Brasil. E eu então senti-me possuído de uma enorme admiração por este povo singular que acabava de vencer uma Copa do Mundo no combate ao comunismo.... Agradecendo a Deus os favores de exceção que de certo modo não merecíamos, agradecia também os favores da natureza e das merecidas consequências. Grande povo! 'A Europa curvou-se ante o Brasil' nos dias de Santos Dumont. Menino de quatro anos, cantei o pequeno hino de nossa projeção internacional. Velho, às portas dos setenta, cantava outro hino e candidamente prelibava a admiração universal diante da facilidade dançarina, graciosa, dionisíaca, com que o povo brasileiro pôs a correr os comunistas. (Mal sabia, na embriaguez de meu entusiasmo, que o mundo inteiro nos caluniaria. Os Estados Unidos com base na superstição de sua liberal democracia, ou no seu 'democratismo', e a Europa com base no esquerdismo que se apoderou dos meios de comunicação).
 
Foi um dos mais belos espetáculos que vi. E tenho pena dos corações alienados que não tiveram a capacidade para acolher tão boa e tão bela alegria. Lembrei-me de uma página de Léon Bloy. A França acabara de marcar a vitória do Marne. Os jornais estavam encharcados de júbilo, de esperança, de triunfo. Mas Léon Bloy folheava os jornais com cólera crescente, e depois com tristeza infinita. O que é que o velho leão procurava nos cantos dos jornais? Lá está escrito em seu Diário: 'Je cherche en vain le nom de Dieu' [Eu procuro em vão o nome de Deus].
 
Ora, em nossa grande Marcha - cuja fotografia está diante de mim - não houve menção de um só nome dos tantos civis e militares que bem mereceram o aplauso do povo. Havia um só nome: o nome de Deus."
 
 
(Gustavo Corção, na sua antológica e densa introdução de "O século do nada", sobre a vitória do Brasil sobre o comunismo em 1964)
 
 

terça-feira, 7 de agosto de 2018

MEMÓRIA DE SÃO DOMINGOS DE GUSMÃO

Urna com os restos mortais de São Domingos, em Bolonha

CUMPRE, Ó PAI, O QUE DISSESTE


Em 1221, numa sexta-feira, 6 de agosto, duma cela do convento dominicano de Bolonha voava para o Céu a alma de São Domingos de Gusmão, o homem que, segundo palavras do Eterno Pai a Santa Catarina de Sena, foi o mais parecido com o Filho de Deus encarnado, na sua alma, no seu corpo e nas suas obras.
 
Nasceu em Caleruega, uma pequena aldeia da Província de Burgos e Diocese de Osma, no dia 24 de junho de 1170, dia da festa de São João Batista, a quem tão de perto viria a imitar no seu longo e fecundo apostolado.
 
A sua família era das mais distintas e ilustres do reino. Filho de pais santos, superou, em ciência e santidade, todos os seus familiares. Aos 14 anos ingressou na Universidade de Palência, sendo considerado, entre os estudantes, um autêntico anjo pela pureza do seu coração e penetração da sua inteligência.
 
Cedo começou a revelar o seu amor aos irmãos carentes, física e espiritualmente, e total desprendimento dos bens terrenos. Um dia, ao verificar os horríveis efeitos da fome por que passavam os pobres, consequência duma prolongada seca, para os poder socorrer vende tudo o que possui, até os preciosos códices por onde estudava, dizendo: "Não quero peles mortas, quando vejo morrer as vivas" [os livros eram feitos de peles de animais]. Outra vez, ao ver uma mulher chorar amargamente por um seu irmão cativo dos mouros, e sem meios para o resgatar, oferece-se para ficar no lugar do prisioneiro e, deste modo, o libertar do cativeiro.
 
Concluídos os estudos, Domingos transfere-se para Osma e ali é eleito arcediago da catedral. Em 1203 acompanha o seu bispo numa longa viagem até à Dinamarca, ao serviço do rei Afonso IX de Leão. Nessa viagem, toma contato direto com a heresia albigense. Em Tolouse, na hospedaria em que pernoitam, Domingos passa toda a noite a disputar com o proprietário da hospedaria, herético fanático, e leva-o a abraçar a verdadeira fé. Este acontecimento constitui um marco decisivo na sua vida: na ânsia de salvar almas, da Dinamarca segue para Roma a fim de obter do Papa autorização para se dedicar à evangelização dos cumanos. Inocêncio III, porém, preferiu confiar-lhe a conversão dos albigenses que assolavam sobretudo o sul da França.
 
Aqui começa a ingente e frutuosíssima gesta apostólica de Domingos. Com a sua alegre e doutrinal pregação, rapidamente conquista a simpatia de alguns jovens universitários que aderem ao seu sublime ideal de conquistar almas para Deus. Rodeado de uma plêiade de virtuosos e cultos sacerdotes, ardendo em vivos desejos de participarem em tão santa cruzada, funda a Ordem dos Pregadores, confirmada oficialmente pelo Papa Honório III, com a Bula 'Religiosam vitam', de 22 de dezembro de 1216.

Domingos e seus filhos "empreenderam viva luta contra os erros e contra os vícios que ao tempo dizimavam o rebanho de Cristo. A vida de São Domingos e´ de uma operosidade que raia pelo inverossímil: pregando, percorreu, sempre a pe´, a Espanha, a França e a Itália; fundou numerosos conventos para homens e mulheres. Deus honrou-o com o dom das profecias e milagres". E, segundo uma tradição imemorial, da Santíssima Virgem, de quem era profundo devoto, numa ermida a ela dedicada, terá recebido a revelação do Rosario; não, e´ claro, como a praticamos hoje, mas na sua gênese.

São Domingos tinha também uma extraordinária devoção a Jesus Eucarístico. Dificilmente se encontrara´ um adorador noturno que, como ele, tenha passado tantas horas junto do sacrário, desde o crepúsculo ate´ o amanhecer, orando em variadas e expressivas atitudes: ora de joelhos, ora de pe´, com os braços em cruz ou de mãos juntas elevadas para o ceu; outras vezes todo prostrado no pavimento da igreja.

Após uma vida tão laboriosa e cheia, Domingos, esgotado pelo trabalho, pelo calor do verão e pela febre, ele, que nunca quis dormir numa cama, nem sequer num simples colchão, viu-se forçado a deitar-se numa pobre enxerga de palha, no convento de Bolonha. Conheceu, então, que chegara a hora de receber o merecido "salario" do seu imenso labor na vinha do Senhor. Com São Paulo, podia dizer confiadamente: "Avizinha-se o tempo da minha libertação. Combati o bom combate, terminei a corrida, permaneci fiel. A partir de agora já me aguarda a merecida coroa, que me entregara´ o Senhor, justo juiz... O Senhor esteve comigo e deu-me forças, a fim de que, por meu intermédio, a mensagem do Evangelho fosse proclamada" (2 Tm 4, 6-8.17).

"Humilde ate à ultima hora, fez confissão geral diante dos irmãos presentes", deixando todos edificados, porque nunca perdera a inocência batismal; pediu o sacramento da unção dos enfermos e o santo viatico e, de seguida, que os irmãos se preparassem para a encomendação da alma. Todos se ajoelharam para iniciar as ladainhas, mas Domingos pediu-lhes que esperassem um pouco e começou a falar-lhes como Jesus aos seus discípulos na ultima Ceia: "Amai-vos uns aos outros, sede humildes, pobres e puros. Deixo-vos este testamento e esta herança com a benção de Deus e a minha".

Chorando, Frei Ventura aproximou-se dele e disse-lhe: "Pai, vede como nos deixais a todos consternados e órfãos. Lembrai-vos de nos quando estiverdes na gloria de Deus". São Domingos levantou os olhos para o ceu, juntou as mãos, rezou e, voltando-se para os seus filhos angustiados, disse-lhes: "Espero no Senhor que depois de morto vos serei mais útil do que em vida. Não vos esquecerei, levo-vos no coração. No ceu ajudar-vos-ei mais do que aqui". E, momentos depois, a sua santa alma voava para Deus. "Ao amortalha-lho, tiraram a cadeia de ferro que lhe cingia o corpo e com que se disciplinava".

Domingos foi canonizado por Gregorio IX a 13 de junho de 1234. A sua festa litúrgica celebra-se a 8 de agosto.

Desde que a trasladação das suas relíquias se fez numa terça-feira (24 de maio de 1232), este dia ficou, na Ordem Dominicana, consagrado ao Santo Patriarca.

Deus de ternura e compaixão, que suscitaste em Domingos o pregador do teu Evangelho de misericórdia, Evangelho da plenitude da justiça, e o levaste a construir uma família que, em obras e palavras, testemunhasse a gratuidade do teu amor, ajuda-nos a encontrar o silencio donde saia a palavra que alumie de esperança a nossa noite e o gesto que nos traga uma paz ardente.

Faz do Espirito de Jesus Cristo a graça da nossa vida. Amém.




Fonte: Novena a S. Domingos. Editorial Apostolado do Rosario. 2. ed. actualizada. Fatima. 2006.

Distribuidor: Secretariado Nacional do Rosario. Padres Dominicanos.
                      Rua de São Domingos s/n - 2495-431 FATIMA
                      E-mail: snrosario@clix.pt
 



quinta-feira, 19 de julho de 2018

O HOMEM ETERNO


O salvamento dos meninos da caverna, de que fomos todos testemunhas, recordou-me uma imensa dívida que tenho comigo mesmo: não li "O homem eterno" de Chesterton. Comecei uma vez, mas empaquei logo no início.
 
A nota introdutória simplesmente esmaga, tritura, H. G. Wells, em resposta a quem o livro parece ter sido escrito. Esse autor escrevera uma "História universal".
 
Há dois capítulos que levam títulos estupendos. A primeira parte está intitulada: "Da criatura chamada homem". Seu primeiro capítulo é: "O homem na caverna".
 
A segunda parte chama-se: "Do homem chamado Cristo", e o seu primeiro capítulo é: "O Deus na caverna". Estupenda comparação de Chesterton!
 
Que eu pague a minha dívida!
 
 

segunda-feira, 4 de junho de 2018

MÊS DO SAGRADO CORAÇÃO

 


Começa o mês dedicado ao Sagrado Coração de Jesus. Trata-se de uma grande oportunidade para meditarmos no amor de Deus. Jesus Cristo não se deixou cuspir, humilhar, flagelar e matar por masoquismo. Mas por amor. Pela excessiva abundância do seu amor. Para que não tivéssemos dúvida da imensidão do seu amor e da abominação que é o pecado. Afinal, o pecado destrói a obra de Deus. Destrói-nos. Destrói o que Deus fez.

Na próxima sexta-feira será a Solenidade do Sagrado Coração de Jesus. Festa móvel, celebrada na sexta-feira da semana seguinte a Corpus Christi. Ao contrário das outras sextas-feiras do ano, não é dia de penitência, nem de abstinência de carne, pois coincide com festa litúrgica do mais alto grau: solenidade. Os dias litúrgicos são classificados, em grau decrescente, em solenidade, festa, memória e memória facultativa.

A meu ver, são providenciais as festas juninas, essas festas calorosas e simples incrustadas no mês de junho. Elas são um símbolo de que no Coração de Jesus, dentro do Coração de Jesus, sempre é festa, sempre há calor, alegria e amor.

Creio ser oportuno destacar algumas datas importantes do mês de junho: dia 24: natividade de São João Batista e aniversário de nascimento de São Domingos de Gusmão, o grande espanhol fundador da ordem dos pregadores (OP) ou dominicanos e criador do rosário. Seu nascimento foi em 1170, em Caleruega, próxima a Burgos, na Espanha; 26: festa litúrgica de São Josemaría Escrivá, outro santo espanhol, mais recente, fundador do Opus Dei; e, 29: São Pedro e São Paulo, as duas colunas da Igreja, solenidade e dia santo de guarda, que no Brasil é transferido para o domingo seguinte.

Esses três grandes santos, São Pedro, São Paulo e São João Batista - além apenas do grande São José -, são os únicos que possuem dois dias litúrgicos ao ano. Isso demonstra a sua grandeza no céu.

Gustavo Corção tem uma belíssima crônica sobre o Coração de Jesus. Chama-se "O coração" e começa assim, esplendorosamente:

"O mundo moderno está doente do coração, porque os poucos que deveriam ser o sal da terra, o tranquilizador do mundo, o vaso dilatador das artérias da história, ávidos de novidades, enfadados, evoluídos, avançados, transmutados, afastaram-se do Sagrado Coração de Jesus." (Em "Melhores crônicas de Gustavo Corção", Editora Global)

O amor de Deus conceda-nos viver bem o mês de junho.

domingo, 29 de abril de 2018

CONGRESSO DO ROSÁRIO OU CERCO DE JERICÓ




Caros amigos e amigas, está se aproximando o Congresso do Rosário ou Cerco de Jericó na Igreja do Carmo, do dia 1.º ao dia 7 de maio, das 13 às 15:30h, com a recitação do rosário completo diante do Santíssimo Sacramento exposto.

Rezaremos pelas suas intenções. Se possível compareça, de preferência durante todos os sete dias, ainda que seja para uma única Ave-Maria. Divulgue!

Você sabe o que é o Cerco de Jericó ou Congresso do Rosário? O Prof. Felipe Aquino responde. Leia pelo link abaixo:


quarta-feira, 25 de abril de 2018

SOBRE O CASO ALFIE EVANS


É estranho, sobrenatural, bizarro o ódio que o mundo tem das crianças, sobretudo não nascidas ou malformadas. Tente defender uma delas e sinta todo o ódio do inferno levantar-se contra você, disfarçado de civilidade, humanismo e de razoabilidade.

Há uma sede de sangue que vem dos abismos, das zonas subterrâneas! Parece haver algo ou alguém sedento de sangue – desde Abel –, que quer sangue, sangue e mais sangue, sangue inocente! Você não pode atrapalhar a oferenda macabra que é feita aos espíritos imundos! Você vai ouvir gritos de condenados, histeria de demônios, na imprensa, nos tribunais, entre os falsos amigos, em toda a parte! Os asseclas do diabo vão vir importuná-lo: “Seja razoável, seu débil mental!” “Nós não o respeitamos!” “Vamos nos unir contra você!” “Vamos denunciá-lo a não sei quem!”

Que dizer também da legião de omissos, das miríades de Pilatos, que poderiam fazer algo, dizer algo e lavam as mãos?

Como são razoáveis e civilizados esses “humanistas” assassinos e cúmplices de assassinos de crianças! Como são ponderados esses liberais! Eles matam de forma tão humana, tão limpa, tão sanitária, tão higiênica!

Vão arder no mais profundo do inferno, se não se arrependerem.


Santo Agostinho e experimentados exorcistas disseram que os demônios sempre se escondem por trás dos ídolos para receber adoração no lugar de Deus. Os deuses do paganismo moderno em quase nada se distinguem dos do paganismo antigo. Talvez tenham mudado de nome ou tenham modos aparentemente mais polidos. Devem ter passado por uma "gourmetização"... Talvez hoje eles se chamem "humanitarismo", "autodeterminação", "individualismo", "bem estar", "pragmatismo", "conforto", "progressismo", "laicidade".

 

A CONVERSÃO DE SANTO AGOSTINHO


"A conversão de Santo Agostinho", do Beato Fra Angelico, dominicano.

No dia 24 de abril a ordem agostiniana comemora a festa da "Conversão de Santo Agostinho". Salvo melhor juízo, 24 de abril foi o dia em que ele foi batizado com seu filho Adeodato numa Vigília Pascal, na catedral de Milão, pelo bispo Santo Ambrósio.

Adeodato, depois de dar mostras de grande inteligência, veio a falecer aos dezessete anos. Deus tinha outros planos para Santo Agostinho, que precisaria estar mais desembaraçado para dedicar-se inteiramente ao serviço de Deus.

A propósito, comecei a leitura de "Agostinho: o homem, o pastor, o místico", da Cultor de Livros, de Agostino Trapè, da Ordem de Santo Agostinho (OSA), que foi superior-geral da ordem e um grande conhecedor da vida e da obra do "doutor da graça". Ao que parece, trata-se da melhor biografia existente sobre o bispo de Hipona.

Trago um pequeno trecho, que li num desses dias:

“Estudou os primeiros rudimentos em Tagaste, ‘grammatica’ em Madaura, retórica em Cartago. Terminados os estudos, abriu uma escola de ‘grammatica’ em Tagaste; depois de um ano ou pouco mais, uma de retórica, em Cartago, depois em Roma; enfim, ensinou retórica em Milão, na Corte Imperial.

Em Cartago, participou de um concurso de poesia e foi coroado poeta pelo procônsul Vindiciano. Em Roma, superada a prova da declamação, o prefeito Símaco o enviou para Milão como professor de eloquência: uma escolha que constituía um sucesso e era o início de sucessos maiores. Em Milão, naquela função, pronunciou o panegírico para o cônsul Bauto e, alguns meses mais tarde, o elogio oficial do imperador Valentiniano II, que tinha, como se sabe, catorze anos de idade. Doze anos de ensinamento e de estudo intenso, acrescidos àqueles empregados nos cursos escolares, deram-lhe a oportunidade de aprofundar-se nas artes liberais e de vir a ser, como era a grande ambição daquele tempo, um homem ‘doutíssimo e eloquentíssimo’.”
(Agostino Trapè, “Agostinho: o homem, o pastor, o místico”, Cultor de Livros, pp. 28-9)

sexta-feira, 20 de abril de 2018

NOSSA SERÁFICA MADRE



Você sabia que Santa Teresa de Jesus morreu às 9 horas da noite do último dia do calendário Juliano, 4 de outubro de 1582, festa de São Francisco de Assis? Que o calendário Gregoriano, para corrigir imprecisões do calendário Juliano, suprimiu dez dias do calendário, de modo que Santa Teresa de Jesus foi enterrada em 15 de outubro de 1582 e não em 5 de outubro?

Parece que Nosso Senhor quis marcar de alguma forma o mundo com a morte de tão grande santa, chamada pelos carmelitas descalços de “nossa seráfica madre”.

Santa Teresa de Jesus  foi a primeira doutora da Igreja, assim proclamada uma semana antes de Santa Catarina de Sena, pelo Papa Paulo VI.

segunda-feira, 16 de abril de 2018

SANTA BERNADETTE SOUBIROUS E ANIVERSÁRIO DE JOSEPH RATZINGER



Hoje a Igreja comemora Santa Bernadette Soubirous, a vidente de Nossa Senhora de Lourdes. Recomendo muito o filme "A Canção de Bernadette", bem antigo, mas que levou quatro oscars, sobre a sua história e a das aparições de Lourdes. Santa Bernadette sofreu muito e foi fiel a Deus e a Nossa Senhora. Foi de uma humildade impressionante.

Hoje também é aniversário natalício de outro herói da fé, muito perseguido, muito humilde e muito fiel a Deus: Joseph Aloisius Ratzinger, o Papa Emérito Bento XVI.

Curiosamente, Bento XVI anunciou sua renúncia ao pontificado no dia 11 de fevereiro de 2013, dia de Nossa Senhora de Lourdes.

domingo, 4 de março de 2018

DOS DIAS DE FESTA


Eis o que dizem o Código de Direito Canônico (CIC: "Codex Iuris Canonici"), o texto da legislação complementar ao código da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e o Catecismo da Igreja Católica sobre os dias de festa, ou dias santos de guarda, ou dias de preceito. Primeiro, o Código Canônico, seguido da legislação complementar:



"CAPÍTULO I
 
DOS DIAS DE FESTA

 
 

Cânon 1246 - § 1. O domingo, dia em que por tradição apostólica se celebra o mistério pascal, deve ser guardado em toda a Igreja como o dia de festa por excelência. Devem ser guardados igualmente o dia do Natal de Nosso Senhor Jesus Cristo, da Epifania, da Ascensão e do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo, de Santa Maria, Mãe de Deus, de sua Imaculada Conceição e Assunção, de São José, dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo, e, por fim, de Todos os Santos.

 
§ 2. Todavia, a Conferência dos Bispos, com a prévia aprovação da Sé Apostólica, pode abolir alguns dias de festa de preceito ou transferi-los para o domingo.*


Cânon 1247 - No domingo e nos outros dias de festa de preceito, os fiéis têm a obrigação de participar da missa; além disso, devem abster-se das atividades e negócios que impeçam o culto a ser prestado a Deus, a alegria própria do dia do Senhor e o devido descanso da mente e do corpo.
 
 
Cânon 1248 - § 1. Satisfaz ao preceito de participar da missa quem assiste à missa em qualquer lugar onde é celebrada em rito católico, no próprio dia de festa ou na tarde do dia anterior.
 
§ 2. Por falta de ministro sagrado ou por outra grave causa, se a participação na celebração eucarística se tornar impossível, recomenda-se vivamente que os fiéis participem da liturgia da Palavra, se houver, na igreja paroquial ou em outro lugar sagrado, celebrada de acordo com as prescrições do Bispo diocesano; ou então se dediquem à oração por tempo conveniente, pessoalmente ou em família, ou em grupos de famílias de acordo com a oportunidade."
 
 
NOTAS EXPLICATIVAS DO PADRE JESÚS HORTAL AO CÓDIGO [não são normas. São explicações de responsabilidade do Pe. Jesús Hortal]:

 
"* 1246. O domingo tem uma consideração especial. Por isso, celebra-se em toda a Igreja, sem exceção (cf. Exortação Apostólica do Papa João Paulo II, Dies domini, de 31 de maio de 1998). Os outros dias festivos podem ceder a considerações particulares. Daí as faculdades concedidas às Conferências Episcopais.
 
No Brasil, por determinação da CNBB, com aprovação da Santa Sé, além dos domingos, são dias festivos unicamente as solenidades de Santa Maria Mãe de Deus (1.º de janeiro), do Corpo e Sangue de Cristo, da Imaculada Conceição (8 de dezembro) e do Natal do Senhor (25 de dezembro); transfere-se ao domingo entre 2 e 7 de janeiro a solenidade da Epifania; transferem-se ao domingo seguinte as solenidades da Ascensão de Nosso Senhor Jesus Cristo, da Assunção de Nossa Senhora, são Pedro e são Paulo e Todos os Santos; não se transfere (mas, como foi dito, não é de preceito) a solenidade de são José.

* 1247. Contra a opinião que se difundiu, um pouco por toda a parte, nos últimos anos, o Concílio não aboliu o preceito dominical (cf. Const. Sacrosanctum Concilium, nn. 56, 106; Decr. Orientalium Ecclesiarum, n. 15; Exortação Apostólica Dies domini, nn. 46-49). A obrigação principal é 'participar' da Missa, não simplesmente 'ouvir', como dizia o velho Código. A abstenção do trabalho se formula agora em termos bem mais flexíveis que antigamente e só enquanto relacionada com a finalidade precípua: a celebração do dia do Senhor.

A Comissão de Reforma rejeitou os pedidos de que o preceito dominical fosse trocado pela obrigação de participar da missa 'uma vez por semana', e de que, nos lugares onde não houvesse missa, ela fosse substituída obrigatoriamente por um culto da Palavra (cf. Communicationes 12, 1980, p. 361). Deu, porém, uma recomendação nesse sentido, no § 2 do cânon seguinte [o 1248]."

 
LEGISLAÇÃO COMPLEMENTAR AO CÓDIGO DE DIREITO CANÔNICO
Texto da CNBB


 
"- Quanto ao cân. 1246, §§ 1 e 2:
 
São festas de preceito os dias de Natal do Senhor Jesus Cristo, do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo, de Santa Maria Mãe de Deus, e de sua Imaculada Conceição. As celebrações da Epifania, da Ascensão, da Assunção de Nossa Senhora, dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo e a de Todos os Santos ficam transferidas para o domingo, de acordo com as normas litúrgicas.
 
A festa de preceito de São José é abolida, permanecendo sua celebração litúrgica."
 
 
CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA
 
 
"2187. Santificar os domingos e dias de festa exige um esforço comum. Cada cristão deve evitar impor sem necessidades a outrem o que impediria de guardar o dia do Senhor. Quando os costumes (esporte, restaurantes etc.) e as necessidades sociais (serviços públicos etc.) exigem de alguns um trabalho dominical, cada um assuma a responsabilidade de encontrar um tempo suficiente de lazer. Os fiéis cuidarão, com temperança e caridade, de evitar os excessos e as violências causadas às vezes pelas diversões de massa. Apesar das limitações econômicas, os poderes públicos cuidarão de assegurar aos cidadãos um tempo destinado ao repouso e ao culto divino. Os patrões têm uma obrigação análoga com respeito a seus empregados." 
 
Como se vê, no Brasil, o dia de preceito dedicado a São José foi abolido, para o meu total desconsolo!, mas não a sua Solenidade. Isso não impede que participemos devotamente da missa no dia da sua festa e lhe prestemos o culto e a veneração devidos! Além disso, alguns dias de preceito são transferidos para o domingo. Atenção para a festa da Imaculada Conceição, 8 de dezembro, que não é transferida para o domingo nem é feriado em todas as cidades, e é dia de preceito! Atenção também para o dia 1.º de janeiro, que é dia de preceito, Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus!

Uma observação importante é que a Igreja exige que as nossas atividades e negócios nos domingos e dias de preceito não "impeçam o culto a ser prestado a Deus, a alegria própria do dia do Senhor e o devido descanso da mente e do corpo" (Cânon 1247, CIC). Não se trata apenas de prestar o culto a Deus, embora seja o principal, mas também de preservar a alegria própria do dia festivo e o devido descanso à mente e ao corpo. Por essa razão, receio que não seja a mais acertada a opinião daqueles que sustentam ser permitido fazer penitência nos domingos da Quaresma. É o caso do Padre Paulo Ricardo.

Nenhum domingo é dia penitencial. E o Código de Direito Canônico é muito claro quanto a preservar-se a alegria própria do dia do Senhor. Não estamos falando aqui de pecado, de abster-se de pecar, de gozos ilícitos que deixam uma frustração e pesar no final, mas de alegrias lícitas, que são boas e agradáveis a Deus e aos homens. Assim, quer-me parecer que Dom Henrique Soares da Costa tem posição mais correta do que o Padre Paulo Ricardo a respeito desse tema. Para Dom Henrique, é proibido fazer penitência nos domingos, inclusive nos da Quaresma.
 
 

sexta-feira, 2 de março de 2018

"ANTES MORRER QUE PECAR"

 
(a esterilização, querida como fim ou como meio, é um pecado grave)
 
Em uma perseguição, todo cristão deve estar pronto a não negar a sua fé para evitar a morte. Portanto, evitar a morte não pode ser uma razão válida para pecar. Isso vale não somente para o pecado de negar a fé. Um exemplo é aquele do pecado de esterilizar-se para não morrer.
cirurgiaCerta vez uma gestante dirigiu-se a um hospital para dar à luz. Era sua quinta gravidez. Por causa da demora da dilatação cervical, o médico comunicou que era conveniente o parto cesáreo. Ao abrir o útero da paciente, o médico mostrou-se assustado e transmitiu à parturiente todo o seu susto.
— Preciso agora mesmo ligar as trompas da senhora!
— De jeito nenhum! – respondeu a paciente na mesa de cirurgia. — Deixe minhas trompas em paz.
— Esta é sua quinta gestação. Seu útero está extremamente desgastado. Ele não vai resistir à próxima gestação. A senhora vai morrer.
Embora não fosse a hora apropriada para gracejos, a mulher perguntou:
— E se o senhor ligar minhas trompas eu terei a vida eterna?
— Não a vida eterna. Mas pelo menos a senhora ficará livre do perigo de uma nova gravidez.
— Ora, doutor, toda gravidez tem o seu perigo. Já enfrentei esse perigo cinco vezes. Estou disposta a enfrentá-lo novamente.
— Mas desta vez o perigo é maior. A senhora vai morrer se engravidar de novo!
A gestante sorriu e respondeu:
— Já me falaram isso na última gestação. E até hoje eu não morri.
O médico não se conformou com a obstinação daquela paciente tão pouco preocupada com a própria morte. Resolveu chamar o marido, que estava na sala de espera, e disse-lhe subitamente:
— Sua esposa vai morrer!
— Isso eu já sabia — respondeu o homem. — Não me casei com uma mulher imortal.
O médico irritou-se:
— O caso de sua esposa é grave! O útero dela está muito debilitado. Se eu não laquear as trompas, ela vai morrer na próxima gravidez!
O marido então falou bem sério:
— Doutor, se o senhor me propusesse arrancar os olhos de minha esposa, eu não aceitaria. Mas o senhor me propõe algo pior: destruir as trompas, que foram criadas por Deus para transmitir a vida! As trompas estão sadias e não põem em perigo a vida de minha esposa. A medicina existe para curar, não para esterilizar. Se, porém, houver realmente um risco muito grande em uma próxima gravidez, eu e ela estamos dispostos à continência periódica enquanto durar o perigo.
— Continência periódica? — perguntou o médico franzindo a testa como quem ouvira o nome de um monstro. — O senhor está falando do método Billings?
— Esse é um dos métodos naturais de regular a procriação sem ofender a Deus.
O médico não conteve sua expressão de desprezo:
— Ora, mas isso falha...
— É verdade — concordou o marido. Embora pesquisas da Organização Mundial de Saúde tenham encontrado uma eficácia bem próxima de 100 por cento, o método Billings pode falhar. Mas a sua previsão da morte da minha esposa também pode falhar. O que não falha é a Providência de Deus. E é nela que eu e minha esposa confiamos.
Estarrecido por ver um casal que não se desesperava sequer com uma previsão de morte, o médico insistiu.
— O senhor já tem cinco filhos. Já pensou se sua esposa morrer na próxima gravidez? Como poderá educar todos eles? Não se importa com a morte dela?
— A morte é dolorosa, mas não é o que mais tememos. O que eu e minha esposa tememos acima de tudo é ofender a Deus. O senhor nos propõe o pecado da esterilização para nos livrar da morte. Mas nós preferimos a morte a cometer um pecado.

Na história imaginada acima, o casal apresentou um conhecimento, uma firmeza moral e uma capacidade de argumentação bem acima da média. Na maioria dos casos, até mesmo os casais mais firmes na doutrina católica vacilam diante da autoridade do médico e do suposto risco de morte. Para evitar tais pressões, justamente na hora em que o casal está mais fragilizado, convém entregar ao hospital uma notificação extrajudicial e exigir uma via como recibo, carimbada e assinada por ele.
Preencher os dados do casal, do diretor do hospital e do médico.
Protocolizar no hospital em três vias.
Guardar uma via devidamente recebida, com identificação e assinatura.
Entregar a outra via recebida para médico obstetra.
NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL
Ilustríssimo Senhor Diretor
Senhor médico Dr. __________________
Hospital ___________________________
[Cidade], ____ de ____ de 20__.
 
Senhor Diretor [escrever o nome completo do diretor do hospital]
Eu, [nome completo da gestante] e meu marido [nome completo do marido] somos totalmente contrários à laqueadura tubária e a qualquer outro procedimento que tenha por efeito imediato tornar impossível a procriação.
Não admitimos tais procedimentos em nenhum caso, nem sequer para evitar um possível dano em uma futura gravidez. Não aceitamos que o parto a ser realizado – natural ou cesáreo – sirva como ocasião para uma esterilização, ainda que feita com a melhor das intenções ou pretextos.
Estamos cientes de que a Igreja Católica condena a esterilização direta como um ato intrinsecamente mau, que não pode ser justificado por nenhuma circunstância nem por nenhuma boa intenção subjetiva[1].
Estamos conscientes de que a lei 9263/1996 proíbe a esterilização cirúrgica sem o consentimento de ambos os cônjuges (art. 10, §5º), sem que tal consentimento seja expresso em documento escrito e firmado (art. 10, §1º) e sem que haja um prazo mínimo de sessenta dias entre a manifestação da vontade e o ato cirúrgico (art. 10, I). Estamos cientes de que a não observância de tais condições faz com que o médico incorra em crime punível com reclusão, de dois a oito anos, e multa (art. 15).
Estamos ainda cientes que, além da pena, a esterilização praticada sem consentimento do casal enseja indenização por dano material e moral, e que a responsabilidade do hospital é objetiva, ou seja, independente de comprovação da culpa, bastando que o ato ilícito seja realizado dentro de suas dependências.
A título de exemplo, a Justiça condenou um hospital e um médico a indenizarem uma dona de casa em R$ 22.800,00 (vinte e dois mil e oitocentos reais), por ter sido laqueada sem sua autorização por ocasião da realização de um parto[2].
A presente notificação extrajudicial previne responsabilidades civis, criminais e administrativas.
[Assinatura da gestante e de seu marido]
Anápolis, 2 de março de 2018
.
Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz
Presidente do Pró-Vida de Anápollis


[1] SAGRADA CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ. Resposta sobre a esterilização nos hospitais católicos. 13 mar. 1975, AAS 68 (1976), 738-740. IDEM. Respostas às dúvidas propostas sobre o ‘isolamento uterino’ e outras questões. 31 jul. 1993. AAS 86 (1994) 820-821.
[2] Cf. TJMG: Hospital e médico indenizam por laqueadura de trompas sem autorização. 5 dez. 2008. https://infojus.jusbrasil.com.br/noticias/334089/tjmg-hospital-e-medico-indenizam-por-laqueadura-de-trompas-sem-autorizacao

quinta-feira, 1 de março de 2018

MÊS DE MARÇO, MÊS DE SÃO JOSÉ




A Igreja dedica todo o mês de março a São José, como também todas as quartas-feiras do ano. Não é por acaso que o grande São José tem o seu mês discretamente imerso e envolto pela quaresma, esse santo grandioso que só faz esconder-se e que só procura a glória de Deus e o bem da sua esposa, Maria Santíssima. Deus respeita e aprecia esse amor de São José pela humildade, pelo escondimento, pelo silêncio, pela penitência e por uma completa e absoluta discrição. Atrevo-me a dizer que São José parece ter um verdadeiro pavor de aparecer e tomar o lugar de Deus e de Nossa Senhora. Ele foge dos louvores, foge das aparências, foge do exibicionismo e de toda falsa piedade. Como todos sabem, o evangelho não nos traz uma única palavra sua.
 
A foto acima é um exemplo eloquente de tudo o que eu disse. Trata-se da fachada da igreja nova do Monastério de São José de Ávila, na Espanha, o primeiro da reforma carmelita, primeira fundação de Santa Teresa de Jesus. Foi tirada no dia 24 de agosto de 2014, portanto, no aniversário da fundação do mosteiro, dia de São Bartolomeu. Tive o privilégio de assistir à missa ali nesse dia.
 
Notem a coincidência providencial: havia um poste na rua, posicionado de tal forma que a sua luz iluminava o menino Jesus, mas mantinha São José na sombra, na penumbra, no apagamento. Esse santo parece realmente ter uma predileção por esconder-se. Só é possível entender São José, compreendendo esse aspecto fundamental da sua personalidade e prodigiosa santidade.
 
Dizem os teólogos que, acima de São José, somente Deus e Nossa Senhora. Ele está acima dos serafins e dos querubins, dos anjos de mais alta hierarquia. A Igreja o venera com o amor de "protodulia" ("proto" quer dizer primeiro), pois, depois de Nossa Senhora, São José é o primeiro e o maior entre todos os santos.
 
Acorramos, pois, neste mês de março, ao glorioso São José! Fortaleçamos nossa devoção a ele! Tributemos-lhe os louvores que lhe são devidos! Imitemos-lhe as incomparáveis virtudes e coloquemo-nos debaixo do seu assombroso poder! E preparemo-nos bem para a sua Solenidade celebrada no dia 19, como também para a Solenidade da Anunciação ou Encarnação do Verbo, no dia 25, recordando que o Verbo Encarnado foi inteiramente confiado aos seus cuidados de pai.
 
Afirma São Pedro Julião Eymard, no seu belíssimo livro devocional "São José, guardião eucarístico": "Josué dominou o sol. José ensinou o criador do sol a caminhar".
 
Neste mês de março, e também em toda nossa vida, repitamos sempre:
 
"São José, meu pai e senhor, intercedei por mim!"
 
 

sexta-feira, 16 de fevereiro de 2018

A DIFAMAÇÃO DO JEJUM


Vejo algumas pessoas, mesmo sacerdotes, desmerecendo o jejum de alimentos na quaresma. Muitos sugerem no lugar o jejum da maledicência. Com a devida vênia, não posso concordar com isso.

Em primeiro lugar, é preciso compreender a razão do jejum, o motivo de a Igreja recomendá-lo.

E a razão é que a nossa natureza, depois do pecado original, dos pecados dos nossos antepassados e dos nossos próprios pecados pessoais, ficou ferida, desordenada, tendendo para o mal, isto é, para os bens fora de sua ordem, fora da ordem estabelecida por Deus, como ensina Santo Agostinho. A rigor, o mal é querer um bem fora de sua ordem, porque o mal não existe como ente. Todas as criaturas são boas em essência, pois foram criadas por Deus. O mal consiste em preferir os bens inferiores aos superiores.

Herdamos uma natureza ferida e corrompida, e a ferimos e corrompemos mais. É o que São Paulo deixa bem claro na sua epístola aos Romanos: "Sabemos que a Lei é espiritual; mas eu sou carnal, vendido como escravo ao pecado. Realmente não consigo entender o que faço; pois não pratico o que quero, mas faço o que detesto. [...] Pois o querer o bem está ao meu alcance, não porém o praticá-lo. Com efeito, não faço o bem que quero, mas pratico o mal que não quero. Ora, se faço o que não quero, já não sou eu que ajo, e sim o pecado que habita em mim." (Rom 7, 14-20).

O jejum, pois, deve ser a privação voluntária de um bem lícito, com a finalidade de fortalecer a vontade, que é uma das três potências da alma (as outras são a inteligência e a memória), e orientá-la para bens maiores, sobrenaturais.

A finalidade do jejum é submeter o corpo ao espírito, e o espírito, a Deus, restabelecendo a ordem rompida pelo pecado.

Por isso, não se trata da privação de algo ilícito: abster-se do pecado é obrigação, não é prática ascética, não é um “plus”.

Quando o evangelho nos conta que Jesus jejuou quarenta dias e quarenta noites, terá sido mero jejum de maledicência? Ele que nunca pecou? Ele que estava sozinho no deserto? Maldizer quem para quem?

Mais: quando Jesus é questionado sobre a razão de os seus discípulos não jejuarem, enquanto os de João Batista e os fariseus jejuavam, tal jejum restringia-se a refrear a língua? Não me parece.

Mais ainda: quando Cristo diz que certos demônios só são expulsos pelo jejum e pela oração, tal jejum será apenas o jejum de maledicência? Será ele suficiente para expulsar os espíritos imundos? Não creio. Perguntem aos exorcistas se funciona. O jejum da quaresma existe para expulsar os nossos demônios que não conseguimos expulsar sozinhos.

Não deve ser novidade para ninguém que a teologia da libertação nega a importância de todos os meios ascéticos, reduzindo a ascese à mera luta de classes, à mera defesa dos supostos interesses temporais dos pobres. Para tal teologia, que esvazia todo o sentido espiritual do cristianismo, realmente não faz sentido o jejum como obra espiritual. Mas sabemos que tal corrente teológica é errada, e que na verdade nem sequer é teológica. É materialismo, é marxismo, disfarçado de religião.

Não há dúvida de que um dos males do nosso tempo é justamente a falta de ascese, a falta de mortificação. É conhecida a máxima: "a temperança gera a riqueza, mas a riqueza gera a intemperança". As prestidigitações da ciência, como diria Corção, evitam-nos os mínimos esforços, como levantarmo-nos da cadeira para mudar o canal da televisão. Isso pode ser confortável para o corpo, mas é um perigo para a alma, que deve estar cada vez mais e mais vigilante, recusando-se o excesso de conforto, pois o nosso corpo, como dizem os santos, é um inimigo que deve ser tratado com caridade, mas é um inimigo traiçoeiro. A natureza humana segue sendo a mesma. Os santos do passado praticaram a vida ascética. E os santos do presente também têm de vivê-la. Não há santidade sem penitência, sem mortificação, sem vida ascética. Não podemos soltar as rédeas do nosso corpo, deixando-o como um animal desgovernado.

Como acertadamente vi uma pessoa dizer outro dia: a finalidade do jejum é fortalecer a vontade para evitar o pecado; é justamente tornar mais fácil evitar a maledicência e outros pecados e vícios. O jejum vem fortalecer o nosso homem interior para vencer o nosso homem exterior.

 

terça-feira, 2 de janeiro de 2018

"DA DIREÇÃO ESPIRITUAL": MAGNÍFICA PÁGINA DE RAÏSSA MARITAIN


O que eu disse acima a respeito de nossa docilidade, em tudo, aos conselhos do Padre Clérissac, e da maneira pela qual esses conselhos levaram Jacques a um preconceito favorável à “Action Française”, que ele lamentaria tão vivamente depois, levanta um problema sobre o qual mais tarde Jacques e eu temos pensado muitas vezes.

Houve da parte do nosso guia uma inadvertência – e da nossa parte um erro – porquanto esse elemento de ordem temporal nunca deveria ter sido apresentado por ele no exercício da sua direção espiritual, nem aceito por nós sem esse exame.

Nessa inadvertência num homem de rara retidão de espírito e de caráter se revelam sem dúvida esses inevitáveis “limites do criado” que o Padre melancolicamente nos fazia notar mesmo na ação dos melhores.

Se tomo a liberdade de formular um julgamento que pode parecer presunçoso com relação a um sacerdote admirável, para com o qual a nossa dívida é imensa, não o faço por prazer, e garanto que não é sem me sentir confusa. Se só tratasse de mim, na pobreza dos meus próprios limites, contentar-me-ia silenciosamente com o exame da minha consciência; mas trata-se do que interessa à própria verdade num certo plano prático, e aí nem a nossa pequenez nem a grandeza de um guia poderiam impedir a verificação de um fato. Um preconceito que no Padre Clérissac era acidental à essência da sua própria vida espiritual e de seus conselhos espirituais – unidos à nossa confiança e à nossa inexperiência – teve consequências graves para nós mesmos e para alguns dos que haviam seguido conosco o estímulo recebido.

Desde então encontramos muitas vezes erros análogos, em diversos sentidos, e observamos as suas lamentáveis consequências. É, pois, de um modo muito geral que consignamos um certo risco inerente à direção das almas e dele falamos aqui. Quaisquer que sejam as críticas em que eu possa incorrer por isso, escrevo estas linhas sem nenhum receio, e de acordo com o sentimento que tenho do meu dever presente. Em toda vida chega um momento em que se torna natural não temer senão o Deus que se ama e de quem se espera a luz e a salvação.

É claro que não ponho em dúvida um só instante a utilidade geral da direção espiritual. Sentimos nós mesmos quão necessários e benéficos foram para nós os guias espirituais que Deus nos fez a graça de enviar e a nossa gratidão para com eles nunca terá fim. Sei também o que Santa Teresa e outros santos ensinaram sobre esse assunto tão importante. Se o próprio Padre Clérissac caçoava dos diretores que dão conselhos às suas penitentes sobre a cor do seu chapéu, ou que pretendem levá-las para o céu “numa poltrona”, estava contudo persuadido, com a tradição cristã, de que as almas, sobretudo quando se encontram nos caminhos da oração, têm uma grande necessidade dos conselhos de um homem prudente e experimentado, e não poderiam, sem temeridade, fiar-se em si próprias. A palavra “paternidade espiritual” seria talvez até mais apropriada aqui do que direção. A autoridade moral de um pai, a educação que dá, são tão necessárias na ordem espiritual quanto na natural. Como, sem ela, poderia a alma libertar-se das ilusões do amor próprio, não se deixar enganar pelas inclinações que formam um todo com a própria natureza individual, fugir às ciladas e às miragens do caminho, e aprender pouco a pouco a formar o julgamento da sua consciência nessa “paz de Deus que ultrapassa todo sentimento”? A alma cristã sabe o preço incomparável da confiança absoluta e da simplicidade através das quais lhe vêm luzes que nada no mundo poderia substituir.

As observações que quisera fazer aqui são observações à margem dessas grandes verdades. Referem-se ao mesmo tempo à prudência do diretor e à do dirigido. A experiência mostrou-nos até que ponto a direção exige do diretor a mais pura discriminação das coisas que são de Deus e das que são de César. Para que seja verdadeiramente espiritual, ela exige que o próprio diretor tenha distinguido em si mesmo o que pertence à ordem da graça, da fé, da teologia e da perfeição, do que pertence apenas à herança humana; hábitos seculares, preconceitos de família, de raça ou de casta, ou à ordem das inclinações individuais: preferências e gostos. Essa discriminação angélica não existe certamente em toda a sua perfeição: mesmo os santos, desapegados de tudo, vestem algum traje do seu tempo. Quase permanece algo que perturba, por menos que seja, a transparência do olhar do diretor mais escrupuloso, e associa às suas diretivas espirituais conselhos ou indicações de uma outra ordem.

Acontece assim, em virtude de entrelaçamentos psicológicos muito difíceis de evitar, que opiniões inteiramente humanas tomem no espírito do que deve praticar a “arte das artes” quase o mesmo lugar que as certezas que se referem à vida sobrenatural, e sejam apresentadas quase da mesma forma que o exigido para a perfeição da alma.

O problema de que falo não abrange apenas o papel do guia espiritual e o número restrito das pessoas que recorrem a um diretor. Considera também, em condições diferentes e num outro nível, o ministério do sacerdote com relação à massa dos fiéis. Como é difícil aqui a situação do padre! Deve ensinar e guiar. E mesmo quando se trata de coisas da terra, deve ensinar e guiar para o céu, e não para a terra. É lamentável que os fiéis recebam às vezes, com o ensinamento religioso, dogmático e moral, conselhos que transmitem aos princípios eternos, preconceitos e paixões de ordem temporal, social e política. A Igreja como tal, porém, só trata das coisas desse domínio nos seus mais elevados princípios – naqueles que dizem respeito à ordem da moral, e cujas aplicações variam ao longo da história humana, e podem ser sadias de acordo com modos analógicos diversos.

Quando a necessidade de uma tal discriminação não é claramente reconhecida, a influência do padre, que deveria ser puramente espiritual e moral, se estende às regiões da contingência política e nos encontramos assim diante do caso em que personalidades eclesiásticas se servem da boa-fé da sua autoridade para levar o povo fiel aos caminhos efêmeros e decepcionantes da política de um país ou de um dia. E isso, às vezes, como vimos na questão da “Action Française”, apesar das diretrizes e ordens do próprio Papa, e sem temer arrastar a uma desobediência formal almas religiosas que sem essa funesta confusão teriam reconhecido a legitimidade da obediência. É assim que se dão os cismas – muito mais em geral por questões de ordem temporal do que por questões de ordem religiosa e teologal.

Quanto ao dirigido, para voltar às nossas primeiras considerações, é claro que o seu próprio bom-senso e sua prudência, e, portanto, a sua responsabilidade, estão em jogo nesse caso. Evitaria certamente erros grosseiros se soubesse claramente desde o começo que por mais grosseira e pobre em virtudes que seja a sua consciência, é a ela no entanto que cabe, afinal, depois de esclarecida por conselhos prudentes, fazer sozinha diante de Deus o julgamento de que depende a moralidade do ato livre: pois a direção espiritual tem por fim ensinar-nos a formar bem, e não a iludir o julgamento de nossa consciência. Perdura, no entanto, o perigo acidental que assinalei, tanto maior para o dirigido quanto, por outro lado, mais segura for a direção que aceitou: a autoridade do pai espiritual admirado e venerado transborda então, quase inevitavelmente, sobre todos os conselhos que dá a uma alma que já tende naturalmente para a docilidade filial.

Essas almas fazem duras aprendizagens. Felizes aquelas em que, à custa de experiências, de erros, de sofrimentos e purificações divinas, se opera a discriminação que não encontraram no espírito de seu diretor. O seu caminho espiritual se simplifica então na medida em que tiver sido purificada, e ela tende a se conformar cada dia mais ao simples caminho da caridade, do amor de Deus e do próximo – em que consistem a Lei e os Profetas. Simplicidade verdadeiramente evangélica, a mais difícil das simplicidades que se possa atingir, cujo nome é sinônimo de perfeição. São essas almas que, pela virtude do Cristo, compensam as nossas faltas e nossos erros no seio da Igreja.


(Raïssa Maritain, “As grandes amizades: (memórias)”)


NOTA: Achei magníficas e sábias essas belas considerações de Raïssa Maritain sobre a direção espiritual. Se as tivermos presentes, evitaremos graves equívocos. Ser prudente, ponderado e equilibrado é sempre necessário.

“A POSIÇÃO DO CORPO” (GUSTAVO CORÇÃO)


Em todos os vários jogos e ofícios que andei aprendendo e ensinando ao longo da vida observei sempre a mesma regra primeira, sem a qual o aprendiz aprende mal ou não aprende. Tomemos como primeiro exemplo o jogo da esgrima: antes de aprender os gestos de prima, segunda, terça e quarta, antes das lições do ataque ou da defesa, o espadachim tem de aprender a fundamental posição do corpo bem plantado em cima das pernas flexíveis e arqueadas, tem de dispor o busto, a cabeça, a cintura e o braço esquerdo, tudo pronto para assumir a mais rica variedade possível de novas posições para o ímpeto ou para a esquivança, para a defesa ou para o ataque. Mas na base de todo esse calidoscópio de gestos vivos e prontos o bom esgrimista há de possuir uma primeira e essencial posição do corpo. E logo se vê, pela especial beleza da especial elegância de cada jogo, quem será esgrimista acima do comum. Observem no jogo do bilhar (refiro-me ao verdadeiro e nobre bilhar francês), e logo verão quem joga e quem não joga pelo simples jeito de pegar no taco e de acavalar os dedos da mão espalmada sobre a lousa. Não há posição do corpo mais ridícula do que a do principiante no bilhar ou na esgrima. Um professor de piano que conheci no grupo d’O Pinguim, com certo exagero de espanhol costumava dizer que os homens têm uma tendência natural de “hacer las cosas mal hechas”. As primeiras lições de piano são silenciosas e mais esculturais do que musicais: são a busca do corpo, o preparo da mão, o retoque do busto; as semifusas virão a tempo, quando o corpo do pianista já estiver amansado. Tenho experiência de vários aprendizados frustrados, e por isso posso gabar-me do oblíquo proveito de tantos fracassos. Anos de má pintura e péssima escultura, dois ou três de um invencível piano, esgrima, e até ano e meio de um violino que só serviu para me inculcar uma ilimitada admiração pelos que conseguem fazer gemer tão absurdo instrumento. Lembro-me das tumultuosas lições de violino de minha irmã ainda hoje caçula de 73 anos com o professor Ronchini, italiano extremamente irascível que se sentia ofendido, ferido em sua honra, quando a menina de sete anos lá nos confins de minha saudade abraçava mal o instrumento e empunhava mal o arco. Mais de uma vez, estando eu na varanda à espera da irmã, vi passar pela janela o arco, como no I ato do Parsifal.

Outra lembrança que me inunda de saudades é a da mão do Sr. Castanheira, meu padrasto: era grande, vigorosa e aristocrática. Via-se nela, no simples jeito de pegar uma ferramenta, e de dominar a matéria trabalhada, toda uma condensação de habilidades disponíveis. Há mãos assim que nos dão a impressão de serem capazes de pensar antes de trabalhar.

Escreveria mais extensamente sobre este transcendente assunto, a posição do corpo, e teria gosto de desenvolvê-lo em outros níveis se o leitor prometesse não se enfadar. No que sairia perdendo porque estou convencido de estar hoje trazendo a mensagem mais proveitosa do que tantas outras que debalde tentei transmitir.

Para cativar o leitor exageremos: tudo na vida depende da posição do corpo. O Evandro Pequeno ou o Ovalle, ambos inesquecíveis personagens d’O Pinguim, um deles, qual?, uma tarde perguntou-nos: “Vocês já repararam que a gente, quando vai pedir dinheiro, fica torto?” E a mímica que acompanhava a tese demonstrava-a cabalmente. Donde concluímos, parodiando o Eclesiastes, que há uma posição para pedir e uma posição para dar, outra posição para tocar piano e outra para a harpa, uma para produzir temor e outra para infundir piedade. Tudo da vida, em suma, é posição do corpo. Sendo verdade, como dizia o Teruz, que todos temos tendência natural de fazer as coisas malfeitas, concluiremos que seria mais proveitoso desentortar os corpos mal crescidos do que lhes estimular, como é moda, uma imprudentíssima criatividade.

Ou então concluiremos, à vista do espetáculo que se nos oferece, que houve um abalo cósmico profundo e imenso e que é o próprio mundo que anda torto em sua posição básica, e grotescos serão os frutos desse aleijão universal.

Sim, é nas coisas básicas e primeiras, e não nas últimas e difíceis, que são hoje cometidos os erros mais ridículos e mais funestos. Como também são as matérias mais gratuitas e abundantes que começam a faltar. Não me refiro ao petróleo do Oriente Médio; refiro-me antes ao AR. Vivemos um arquejante fim de civilização. Temos falta de ar. Ouvi há dias uma conferência sobre a poluição do ar, sobre a poluição da água e sobre a poluição sonora. De todos esses disparates eu me escandalizo muito mais com a ONU do que com as guerras, porque as situações internacionais que levam às guerras ainda guardam coerência com a lei natural que compele o homem à defesa de seus bens, pelos quais sempre houve uma normal disposição de lutar até o sangue. O que me parece muito afastado do normal é o himalaia de imposturas que foram inventadas com o pretexto de evitar os horrores das guerras, e que produziram esse horror de paz em que se polui o ar, a água, e sobretudo se poluem as almas. E diante da monstruosa apologia da monstruosidade, diante da insensibilidade universal produzida nos lugares instituídos para apuro do homem, diante de tal amontoado de coisas malfeitas, sou forçado a concluir que o mundo inteiro deu uma reviravolta, um mau jeito do corpo, e ficou torto.

Teremos de começar pelo princípio. E se não insistirmos na ortopedia mundial e na doutrina que exige previamente a posição certa para o corpo, receio muito a grande explosão que será produzida pela massa pavorosa de asneiras concentradas. Ouvi dizer, entres outras hipóteses, que as estrelas novae surgem por condensação da poeira espacial. A hipótese que transforma a fuligem em estrela tem sua beleza. Receio que nosso mundo, na direção que tomou, conseguirá o prodígio maior de transformar em alguma Aldebarã o pó e o cacarejar das academias e dos institutos de Justiça e Paz.

Empreendamos, pois, a nossa cruzada pelas coisas bem-feitas, a começar pelo reaprendizado da posição do corpo, se na verdade quisermos prolongar um pouco a lenda do homem neste nobre planeta que viu sua casca vibrar com tantos golpes de heroísmo e tantos passos da santidade. Se não, se já estão fartos, é só deixar tudo correr como lá vai e como se lê nas folhas.


(Gustavo Corção, “Conversa em sol menor: memórias recolhidas”)