sábado, 20 de dezembro de 2014

HÃ?


Hermengarda era uma mulher muito inteligente. Ela sempre pensava muito pra falar, e mais ainda pra responder. Escrava da opinião alheia, afeita às gargalhadas, era sempre atenta ao que lhe cairia melhor. Servia-se a torto e a direito do indefectível “Hã?”, não por não entender o que o interlocutor lhe perguntava, mas para escolher, como se escolhe um vestido, a resposta que lhe conviria melhor.
 
A esse tipo de escolhas supérfluas tinha-se acostumado nossa heroína. Suas vestimentas estavam sempre destinadas a causar sensação, chamar a atenção para o belo desenho das suas formas, bastante curvilíneas, ainda que fosse uma coroa de quarenta anos, com trejeitos de adolescente mais que segura. Tão cheia de si e tão ciosa dos seus contornos, Hermengarda revelava sua falta de conteúdo. Não havia lugar nem espaço para os outros e para indagações de maior vulto no morno recôncavo da sua mente. Orgulhava-se de saber contar piadas, dramatizava, mas não sabia sorrir. Aliás, seus sorrisos eram de arame, de gesso, de concreto armado, de alguma coisa tensa que enrijecia os músculos da face.
 
Queria invariavelmente ser o centro das atenções, das conversas, ainda que pelas motivações mais pueris, como a sua seminudez física, sintoma, aliás, da sua seminudez espiritual. Ao exibir o corpo, Hermengarda escondia o vazio, a completa nudez da sua alma. Embora soubesse argumentar, divertia-se em mentir. Fingir era sua especialidade. Fazer tipo era o seu principal passatempo. Vestia-se com as ideias e os assuntos da moda.
 
Hermengarda era simpática – na verdade, bem menos do que imaginava –, mas daquela simpatia artificial e demagógica que ofende as pessoas de bem. Falava pelos cotovelos e parecia mesmo ter sido criada ao léu da sorte, como um cavalo sem rédeas e sem disciplina. Gênio indomável, era capaz de usar os outros e a sua bela aparência para atingir seus objetivos, por mais insignificantes que fossem. A dissimulação era a sua grande arma, o seu grande trunfo, de que poucos se apercebiam. Tão acostumada a mentir aos outros, passou a mentir a si própria...
Hermengarda era infeliz. Tão infeliz, mas tão infeliz, que sequer se dava conta da sua infelicidade. A pirotecnia das frivolidades, o festival das aparências, as exterioridades, as extravagâncias de que este mundo está cheio, as luzes de Natal, embriagavam-na, entorpeciam-na, cegavam-na, e, cega, bêbada, cambaleante, trôpega, tudo lhe parecia bem. Suas risadas eram gargalhadas de bêbado. Seus comentários sobre os outros não atravessavam a epiderme, a superfície, a zona cutânea. Tinha aversão, ainda que inconsciente, a toda espécie de honestidade e autenticidade. A sinceridade parecia-lhe um muro, um murro, um golpe. A verdade soava-lhe dura, áspera, implacável. Seu mundo era o de holofotes imaginários que a acompanhavam por toda parte. Ela não andava; desfilava.

Mas um dia a coisa começou a mudar...

(continuarei em breve)

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

A EXTREMA-UNÇÃO



Uma simpática amiga, cujo esposo também é meu amigo, pediu-me certa vez que eu escrevesse sobre a unção dos enfermos, este sacramento terrível outrora chamado de extrema-unção. (Foi o Concílio Vaticano II, nos números 73-75 da Constituição 'Sacrosanctum Concilium', que ordenou a troca do nome). Parece-me que o momento é oportuno para falar dele, pois o mês de novembro, o último do ano litúrgico, além de mês dos mortos, dos finados, é dedicado à meditação dos novíssimos, isto é, dos últimos acontecimentos da vida do homem: morte, juízo, céu, inferno e purgatório. Comecei a redigir este texto em novembro.

Toda vez que eu saibo de alguém das minhas relações que fica gravemente enfermo, a primeira coisa que me ocorre é indagar se tal pessoa recebeu a unção dos enfermos. Pode ser que às vezes eu cometa uma indiscrição. Em algumas ocasiões, os parentes próximos do enfermo assustam-se, como se tal indagação equivalesse a uma sentença de morte para o doente. É como se eu dissesse: “Coitado, esse aí vai vestir o paletó de madeira!”, “Esse aí já era!”, “Vai bater a cachuleta!”, “Finou-se!”.

Ainda não fui capaz de vencer a falta de habilidade com as palavras e com as pessoas, mas tenho pelo menos dois argumentos em minha defesa, que, se não me absolvem, pelo menos me atenuam a culpa: o primeiro é que a unção dos enfermos não se destina apenas aos que vão morrer, mas tem finalidade curativa, destina-se a curar, ainda que precipuamente a alma. Diz São Tiago no final da sua epístola (Tg 5,14-15): “Alguém dentre vós está doente? Mande chamar os presbíteros da Igreja, para que orem sobre ele, ungindo-o com óleo em nome do Senhor. A oração da fé salvará o doente e o Senhor o aliviará; e, se tiver cometido pecados, estes lhe serão perdoados.” (Pois bem. Embora o católico não viva apenas da Bíblia, mas da Bíblia, da Tradição e do Magistério, o sacramento de que nos ocupamos tem base bíblica, embora não exclusivamente. A Tradição e o Magistério também o consagram). O segundo é este: com a salvação eterna não se brinca; não podemos deixar que uma pessoa se perca por respeito humano.

O Código de Direito Canônico também vem em meu socorro. No cânon 1001 ele diz: "Cân. 1001. Cuidem os pastores de almas e os parentes dos enfermos que estes sejam confortados em tempo oportuno com esse sacramento".

Já falei disso uma outra vez: a estranha capacidade do homem de nossos dias de esquecer o mais importante, de relegar o essencial ao segundo plano, deixa-me perplexo. A hora da morte não é para brincadeiras. Ninguém vai se preocupar com sujar ou estragar um terno, atrapalhar o penteado, perder a pose ou a compostura, se o que estiver em jogo for uma vida humana, se uma pessoa estiver morrendo na sua frente e um ato seu puder salvá-la. Ocorre que aqui estamos diante de algo muito mais grave do que a mera morte física ou biológica: a morte espiritual, o inferno eterno, sofrimentos insuportáveis a que nenhuma outra morte porá fim.

A ideia que faço do inferno é a seguinte: é a de um desespero insuportável, de uma dor talvez até mais moral, espiritual, do que física, pior que a de um suicida, com o agravante de que não há morte que possa interrompê-la, não há remédio para esse mal. Digo isso porque o desespero de um suicida é o pior sofrimento que eu consigo imaginar sobre a face da terra.

Um padre sábio uma vez me disse ter notícia de muitos casos de moribundos que parecem estar justamente esperando a unção dos enfermos para morrer. Eles sobrevivem miraculosamente, ou quase isso, até a chegada do sacerdote. Recebida a unção, eles entregam a alma a Deus. Observemos que a unção dos enfermos, como atesta São Tiago, perdoa os pecados. Além disso, conforta e revigora a alma, fortalece-a no combate da doença e das tentações. Talvez esses moribundos não se salvassem se não tivessem recebido o sacramento.

Santa Faustina, em seu "Diário", demonstra-nos que a hora da agonia é uma hora tremenda, é uma hora grave e decisiva, em que os demônios tentam-nos com especial força. Não deve ser por qualquer motivo ocioso que nas Ave-Marias pedimos a intercessão de Nossa Senhora para a hora da nossa morte. Santa Faustina tinha muita compaixão pelos agonizantes.

Estabelece, a respeito da unção, o Código de Direito Canônico:

"Cân. 1004 - § 1. A unção dos enfermos pode ser administrada ao fiel que, tendo atingido o uso da razão, começa a estar em perigo por motivo de doença ou velhice.

§ 2. Pode-se repetir este sacramento se o doente, depois de ter convalescido, recair em doença grave, ou durante a mesma enfermidade, se o perigo se agravar.

Cân. 1005 - Na dúvida se o doente já atingiu o uso da razão [normalmente se considera a idade de sete anos], se está perigosamente doente, ou se já está morto, administre-se o sacramento.

Cân. 1006 - Administre-se este sacramento aos doentes que ao menos implicitamente o pediram quando estavam no uso de suas faculdades.

Cân. 1007 - Não se administre a unção dos enfermos aos que perseverarem obstinadamente em pecado grave manifesto."

O Papa Paulo VI, na sua Constituição Apostólica sobre o Sacramento da Unção dos Enfermos, de 30 de novembro de 1972, esclarece que a referida unção é atestada na tradição da Igreja, sobretudo em sua liturgia, pelos mais antigos testemunhos, tanto no Oriente como no Ocidente.

O mesmo Paulo VI aprovou o Rito da Unção dos Enfermos e sua Assistência Pastoral, promulgado por Decreto da Sagrada Congregação para o Culto Divino de 7 de dezembro de 1972.

É importante frisar que antes de uma operação cirúrgica pode ser dada ao enfermo a unção sagrada sempre que uma doença grave seja a causa da intervenção. A velhice também, desde que comece a oferecer perigo de morte, é motivo para a unção dos enfermos. O tempo oportuno do sacramento, pois, é o momento em que começa o perigo de morte. Não é necessário que esta seja iminente, que o enfermo esteja à beira da morte. Basta a probabilidade, não se exigindo que seja mais provável que morra do que sobreviva.

Do referido ritual de 7 de dezembro de 1972, extrai-se:

"Para atender mais facilmente aos casos particulares, em que os fiéis, por doença repentina ou qualquer outro motivo, se vejam de repente em perigo de morte, recorra-se ao Rito Contínuo, pelo qual o enfermo recebe sucessivamente os sacramentos da Penitência, da Unção e da Eucaristia sob forma de viático.

Porém, se há perigo de morte iminente e não houver tempo para ministrar todos os sacramentos do modo que foi estabelecido, dê-se primeiro ao doente a oportunidade de uma confissão sacramental, ainda que realizada genericamente em caso de necessidade; em seguida seja-lhe dado o viático, que todos os fiéis em perigo de morte têm a obrigação de receber. Finalmente, se ainda houver tempo, seja-lhe ministrada a Sagrada Unção.

Se, por motivo de enfermidade, não puder receber a sagrada comunhão, seja-lhe conferida a Unção dos Enfermos."

Recorde-se que a unção dos enfermos perdoa os pecados, se o enfermo não estiver em condições de obter tal perdão pelo sacramento da Penitência, como esclarece o Catecismo da Igreja Católica. Se o enfermo estiver lúcido e em condições de confessar-se, deve fazê-lo, dispondo-se bem para receber a unção, sobretudo se estiver em pecado mortal. Como esclarece o Padre Paulo Ricardo, o perdão dos pecados na unção dos enfermos é efeito secundário. Ele é efeito primário de outro sacramento: a confissão.

Acrescente-se, ainda, que o sacerdote, ao administrar os sacramentos ao fiel em perigo de morte (se possível, a confissão, a unção e a Eucaristia ou "viático"), pode conceder-lhe a bênção apostólica com a indulgência plenária (em artigo de morte), mesmo que tal fiel já tenha recebido outra indulgência plenária no mesmo dia. Trata-se de uma exceção.

Sobre isso, a norma 18 da Constituição Apostólica sobre a Doutrina das Indulgências do Papa Paulo VI, de 1.º de janeiro de 1967, complementa:

"N. 18. No caso da impossibilidade de haver um padre para administrar a um fiel em perigo de morte os sacramentos e a bênção apostólica com a indulgência plenária a ela ligada, de que se trata no cân. 468, parágrafo 2, do CDC [trata-se do Código de Direito Canônico anterior], concede benignamente nossa piedosa Mãe Igreja a esse fiel bem disposto a indulgência plenária a lucrar em artigo de morte, com a condição de ter ele durante a vida habitualmente recitado algumas orações. Para aquisição dessa indulgência é louvável empregar um crucifixo ou uma cruz. Essa mesma indulgência plenária em artigo de morte pode ser ganha por um fiel, ainda que ele já tenha no mesmo dia ganho outra indulgência plenária."

Por tudo isso, meus amigos, não negligenciemos o tesouro espiritual que a Igreja, Mãe solícita e mestra, põe em nossas mãos.

quarta-feira, 26 de novembro de 2014

ERASMO, O ASNO


Erasmo de Roterdã (sim! Trata-se de um caso de homonímia!) era um ser de uma espécie superior. Na verdade, para dizer melhor, era um ser superior da sua espécie. Asno de nascimento e por um implacável decreto da natureza, possuía uma inteligência maior que a de muitos seres humanos, tanto que fora admitido – apesar do seu mau cheiro de animal e dos hábitos alimentares pouco ortodoxos – aos estudos, aprovado no vestibular e encontrava-se cursando o último período de direito, em uma honrada instituição universitária.

Aquela criatura peluda, que precisava sentar-se nas últimas carteiras para não atrapalhar a visão dos colegas, era um dos melhores alunos da classe, possuía boas notas e deixava pasmos todos os que assistiam às suas incríveis intervenções em sala de aula, saborosamente perspicazes. Tudo indicava seria ele o orador da turma – apesar dos relinchos que às vezes inadvertidamente soltava –, pois além de ter boa voz, escrevia bem, ousando até a publicar artigos no jornal dos estudantes. Todos criam que ele ganharia o prêmio conferido ao melhor aluno da turma.

No princípio do curso, Erasmo chegou a interessar-se por algumas colegas, mas era um pouco tímido e reservado – quase um criado-mudo! –, devido à terrível fama de seus ancestrais de dedicar-se diuturnamente a asneiras. Um certo complexo de inferioridade assaltava-o, dificultava-lhe as relações, além do seu temperamento assertivo e um tanto quanto renitente. De quando em quando, alguns colegas montavam nele, expondo-o à zombaria coletiva, mas havia também os companheiros leais e inseparáveis, que o defendiam, animavam e admiravam.

Alguns diziam:

– Esse burro vai longe!

Outros prognosticavam:

– Esse asno vai acabar sendo juiz!

Outros criticavam-no por às vezes pastar alguma grama da redondeza, ao que ele, espirituosamente, retrucava:

– Vocês comem o bandejão e estão falando de mim?!

Erasmo era um espantoso caso de animal com alma racional. Muitas vezes fora expulso da faculdade pelos vigias, açoitado por alunos de outras turmas, que imaginavam tratar-se de um quadrúpede estúpido qualquer e o enxotavam como se faz a um cachorro que entra numa igreja. Contudo, logo vinha alguém que conhecia os seus peculiares predicados, a sua inusitada condição de aluno quadrúpede, de animal dotado de razão, mais do que isso, de aguda razão. Alguns acabavam recordando-se de tê-lo visto uma ou outra vez falando no orelhão.

Mesmo andando sobre quatro patas, algumas coisas estupefaziam-no. Ele tinha a impressão de que muitos de seus colegas ruminavam, só que com a silenciosa docilidade dos cordeirinhos. Ele via uma estranha linearidade no comportamento do rebanho, equivalente à dos de sua espécie que sempre fazem a mesma coisa, sem maiores reflexões, desde que o mundo é mundo. Percebia, com estarrecimento, que alguns de seus amigos eram tão dóceis aos mestres quanto seus irmãos aos capatazes. Novamente, com uma diferença: seus irmãos sabiam dar coices!

Mas, voltemos ao último semestre. Erasmo estava concentrado nos estudos. Vivia como um asceta. Não bebia, não fumava, não ia pras baladas. Nem sabia quem estava pegando quem. Ele nem se dava conta da existência de uma sua colega, mula, que partilhava algo de sua índole. Só por isso não a mencionei ainda. Também ela era um ser superior. Superior às outras mulas. Ademais, era belíssima, meiguíssima, finíssima, humílima e vários outros íssimas. Não se sabe como, mas era mais bela que todas as outras alunas reunidas e elevadas à décima potência. O sonho de consumo de qualquer animal menos distraído. Também ela passara pelos dissabores de possuir uma alma racional em corpo de animal. Apenas seu nome soava um pouco estranho: Suplícia, mas tinha algo que ver com a sua sorte. Suplícia apaixonou-se por Erasmo.

Lançando mão de recursos mais ou menos sutis, de expedientes mais ou menos criativos, Suplícia tentava a todo custo chamar a atenção de Lutero, digo, de Erasmo, que, absorto em suas meditações, absolutamente não a notava. Deixava ela às vezes cair os livros no chão para que ele pegasse, o que este fazia de bom grado, mas sem distinguir o dolo específico contido na ação da estupenda, extraordinária, magnífica e fenomenal colega.

Depois de muita persistência de Suplícia, caíram as escamas dos olhos de Erasmo e ele viu. Viu que ela o amava. Começaram a namorar... Só que o namoro não demorou muito, pois Erasmo era um asceta, um místico, um ser esquisito, que só pensava em estudar.

Suplícia não se conformou com o rompimento, que lhe partiu o coração. Caiu em depressão profunda, começou a embriagar-se e a usar drogas. Sua aparência tornou-se horrível. Parecia não dormir. Alguns diziam:

– Vejam o seu estado deplorável! Está apaixonada! Não se valoriza!

Outros comentavam:

– Não suportou o baque. Ficou louca. Perdeu a cabeça.

Suplícia tentava preencher o vazio que havia em si, o vazio deixado por Erasmo. Mas trocava os pés pelas mãos, digo, as patas traseiras pelas dianteiras. Rolava ladeira abaixo, na ladeira da existência. Perdeu o juízo.

E essa, meus amigos, acreditem ou não, é a verdadeira história, é a verdadeira origem da mula-sem-cabeça.

Paul Medeiros Krause
 

terça-feira, 25 de novembro de 2014

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

MÁSCARAS


            Prezado leitor, será que nós estamos plenamente convencidos de que Deus criou-nos para a felicidade suprema e completa? Será que nos conduzimos por essa verdade?

 

            Estou me aproximando dos meus quarenta anos, no ano que vem os completo, se Deus quiser, e as leituras e a experiência de vida acumuladas até aqui levam-me a crer que a maioria de nós não nos convencemos da nossa vocação inadiável para a felicidade. Ou, dito de outra forma, estou convencido da existência de uma tentação sutil, sorrateira, que o demônio arma aos crentes: a ideia ilusória de que seguir o caminho de Deus significa negar a própria natureza, o aniquilamento do próprio eu, o sacrifício da espontaneidade e da criatividade, a mutilação da personalidade.

 

            O demônio é como o PT, na verdade, o PT, verdadeira sucursal do inferno, é como o demônio: acusa os outros do que ele faz. A grande verdade é que o capeta, quanto mais uma pessoa a ele se confia, de forma tácita (talvez a mais comum) ou expressa, mais destrói a sua natureza, o seu eu, a sua identidade única, a sua liberdade e espontaneidade. As personalidades confiadas ao pai da mentira são fragmentadas, sem unidade e coerência. O diabo, astuto conhecedor da natureza humana, sugere continuamente aos homens a ideia de que Deus os quer tristes e frustrados, os quer mutilados, quer negar-lhes tudo. Lembremo-nos da primeira mentira da serpente no Livro do Gênesis: “É verdade que Deus vos proibiu de comer de toda árvore do jardim?”.

 

            O Livro do Gênesis é de uma atualidade gritante. Aquela mentira é diuturnamente soprada aos ouvidos da nossa alma pelo inimigo do gênero humano. Desgraçado, derrotado, sumamente infeliz, invejoso, escravo dos seus vícios, Satanás deseja ver-nos desgraçados, destroçados, fragmentados, sumamente infelizes como ele.

 

            Há uma máxima, salvo engano, da teologia escolástica: “A graça não anula a natureza, mas a leva à perfeição”, isto é, a ação de Deus, a ação do Espírito Santo na alma em estado de graça, não destrói a natureza humana, não a mutila, não a cerceia, mas eleva-a, aperfeiçoa-a. Nesse sentido, só pode ser uma tentação diabólica pensar que a ação do Espírito Santo na nossa alma aniquilará o nosso próprio eu, sufocará a nossa individualidade, destruirá os nossos gostos, as nossas inclinações, eliminará os nossos lazeres, lançará uma camisa de força em nossa criatividade. Nada mais falso! É justamente o contrário. O Espírito Santo tão somente aperfeiçoará os nossos mais legítimos anseios, orientando-os para o seu pleno atingimento.

 

            É por desconhecer essas verdades que muitas vezes usamos máscaras. É por ignorar isso que tantas vezes nos apresentamos diante de Deus e dos homens como nós não somos, exibindo virtudes que não possuímos e dissimulando nossos defeitos. Temos uma visão equivocada, distorcida e estereotipada da santidade. Muitas vezes, até para rezar, utilizamos entonações sentimentais, piegas, esquisitas, pasteurizadas, como se a eficácia da nossa oração dependesse de uma certa homogeneidade, da opinião exterior da assembleia, e não da nossa nudez, da nossa tranquila simplicidade diante de Deus, que conhece até as dobras das nossas almas. Muitas vezes temos a ideia falsa de que Deus deseja um monte de robozinhos que O sirvam. Esses robozinhos, se olharem para o lado, já estariam pecando. Nada disso. Isso é escrúpulo.

 

            “Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”. Deus não nos quer com máscaras. Deus não nos quer com poses de santos; quer-nos santos, sem pose. Santos ao natural, com os cabelos ao vento. Ele não quer entonações afetadas, sorrisos forçados, artificialismos. Ele quer que sejamos santos com toda a tranquila espontaneidade que emerge das nossas almas banhadas pela luz do seu Espírito. Deus quer expandir a nossa personalidade ao máximo, e não manietá-la. Não é à toa que, ao ressuscitar Lázaro, Cristo mandou que o desligassem, o desamarrassem. Deus não nos impõe pesos desnecessários, pois o seu fardo é suave, e o seu peso, leve.

 

            O Espírito Santo é criativo por natureza, e Ele quer que sejamos livres, criativos também. Deus só nos proíbe a autodestruição. O pecado é uma espécie de automutilação, de autoflagelo ou suicídio espiritual. A Lei de Deus, portanto, só nos proíbe de ferirmos a nós mesmos e aos outros. O pecado nos desfigura; a graça nos cura.

 

            É sempre bom lembrar as palavras do Papa João Paulo II no início do seu Pontificado: “Não, não tenhais medo! Antes, procurai abrir, melhor, escancarai as portas a Cristo! Ao Seu poder salvador abri os confins dos Estados, os sistemas econômicos assim como os políticos, os vastos campos de cultura, de civilização e de progresso! Não tenhais medo! Cristo sabe bem 'o que é que está dentro do homem'. Somente Ele o sabe!”

 

            O que Deus nos tira, meus irmãos, é o que não é Dele: são as falsas alegrias, os falsos gozos, as falsas amizades, as falsas esperanças neste mundo ilusório, pois, como diz São Paulo, “a figura deste mundo passa”.

 

            Tenhamos a coragem de ser nós mesmos. De corresponder cada vez mais à nossa própria natureza, à nossa própria identidade. Deus que nos criou com todos os nossos dons quer que os desenvolvamos ao máximo, e não que enterremos nossos talentos na terra. Ele mesmo disse isso no Evangelho. Ele não quer tolher a nossa personalidade, não quer vestir-nos uma camisa de força. Pelo contrário, o Espírito Santo é o espírito da abertura, da alegria, da liberdade calma, da espontaneidade tranquila, da simplicidade serena. Nosso Criador não nos deu dons para que nós os atrofiássemos.

 

            Confesso a vocês, e talvez já tenha dito isso antes, para mim, as manhãs de domingo são uma metáfora, uma figura do paraíso, da eternidade. Quando vou fazer meu esporte nas manhãs de domingo, vejo tanta alegria, tanta espontaneidade, tanta criatividade nas pessoas: vejo bicicletas diferentes, skates diferentes, tantos tipos de motos, carros, brinquedos e diversões. Vejo coisas que eu nem imaginava que existissem. Estou seguro de que o paraíso é assim: uma explosão de felicidade, de criatividade e de espontaneidade, em que as nossas personalidades se mostram integralmente e encontram a sua plena realização e o seu pleno desenvolvimento, sob o sol luminoso da presença de Deus.
 

 

Paul Medeiros Krause
 
 

segunda-feira, 27 de outubro de 2014

MÊS DO SANTÍSSIMO ROSÁRIO


Caros amigos, outubro é o mês do santíssimo rosário, essa oração imprescindível à vida de todo católico. Como costumam ser as coisas de Deus, simples e profundo, profundo e simples.

 

Talvez nem todos saibam, mas o mês do rosário possui 33 dias; começa em 1.º de outubro e termina em 2 de novembro, finados. Essa feliz coincidência é importante, pois revela-nos a união indissolúvel que há entre o culto mariano, a recitação das Ave-Marias, e a contemplação da vida terrestre de Jesus Cristo, que, segundo a ideia normalmente difundida, teria morrido aos 33 anos. (Afirmam os entendidos – as notas ao começo do Evangelho de São Lucas da Bíblia de Jerusalém – que Jesus Cristo morreu na verdade com 37 ou 38 anos. Mas isso não vem ao caso agora.)

 

A mim me parece que a devoção ao santo rosário é prefigurada no Antigo Testamento em Davi que abate Golias. O pequeno Davi simboliza o fiel. Golias, o demônio. A arma que Davi utilizou para vencer Golias era particularmente rudimentar: uma funda, uma corda ou correia circular, por meio da qual poderia lançar pedras em seu adversário. Ora, a funda e a pedra recordam-me imediatamente o santo rosário: um conjunto de pedrinhas presas a uma cordinha circular.

 

Meditemos um pouco mais na cena. Notemos a desproporção de forças entre o menino e o gigante. Nós, pobres descendentes de Adão, diante do demônio, criatura angélica, somos talvez menos que um simples menino. Há uma brutal desproporção de forças entre um ser humano e uma criatura angélica, que é puro espírito. Tal desproporção aparece também nas armas utilizadas pelo guerreiro Golias e pelo pastor Davi, em quem não assentaram bem as roupas de combate.

 

Notemos ainda outros detalhes. A funda é uma espécie de corda ou correia usada em forma de círculo para fazer girar uma pedra até que adquira força suficiente para ser lançada contra o adversário e feri-lo. A própria forma dos objetos rosário e terço é também circular e, como há repetição de movimentos no girar a pedra, há também repetição no recitar das Ave-Marias e das outras orações vocais. Além disso, pode-se pensar como que numa forma circular do nosso pensamento enquanto medita um dos mistérios do rosário, em cada dezena. Durante a dezena, é como se aquele mistério contemplado, seguindo o ritmo dos recomeços das Ave-Marias, fosse ganhando força dentro da nossa alma.

 

Mais ainda: diz o Primeiro Livro de Samuel que Davi trazia cinco pedras em seu alforje, exatamente o número de mistérios que compõem cada terço. As pedras trazia-as em seu alforje, como que a significar o terço, objeto, que grande parte dos católicos traz sempre consigo, normalmente em seus bolsos. É raro alguém trazer consigo o rosário completo.

 

Davi prevaleceu contra o filisteu, com uma funda e com uma pedra. Assim também o cristão prevalece contra Satanás com o rosário da Virgem Maria. Toda a simplicidade, toda a aparência inofensiva e rudimentar do terço não comprometem sua extraordinária eficácia. Pelo contrário, parece que sua eficácia reside exatamente aí: na força que Deus, pela intercessão da Virgem Maria, infunde misteriosamente à sua aparente impotência. A pedra atirada por Davi incrustou-se na testa de Golias, na sua cabeça, sede do orgulho. Lembremo-nos do que diz o Livro do Gênesis: “Porei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e a dela. Ela te ferirá a cabeça e tu lhe ferirás o calcanhar”. A cabeça da serpente simboliza a sede do orgulho, destroçada pela simplicidade de Maria, de que se reveste o terço ou rosário.

 

Não seria demais recordar uma das possíveis origens do rosário. Os religiosos ou membros de ordens terceiras analfabetos, com pouca instrução, não podendo rezar os salmos, que integram as orações litúrgicas da Igreja e são em número de 150, rezavam 150 Ave-Marias em seu lugar. Mais uma vez aparece Davi na história do rosário, e a simplicidade deste, ao facilitar às pessoas com pouca instrução fazer suas orações.

 

Peçamos a Nossa Senhora a graça de rezarmos o terço ou rosário todos os dias como arma contra os nossos inimigos espirituais.


 
Paul Medeiros Krause

terça-feira, 7 de outubro de 2014

NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO



Uma das minhas maiores devoções é a que Igreja celebra hoje: Nossa Senhora do Rosário, que começou com a vitória da Igreja sobre os turcos, com feições marcadamente sobrenaturais, dada a desigualdade de forças entre os dois exércitos, e com a consequente instituição da festa de Nossa Senhora da Vitória.

Depois da Santa Missa, o rosário é a oração mais perfeita e eficaz. Por isso mesmo, é a minha maior devoção, depois da Missa.

Assista ao vídeo abaixo do Pe. Paulo Ricardo:

https://padrepauloricardo.org/blog/nossa-senhora-do-rosario?utm_source=Lista+de+E-mails+%5BPadre+Paulo+Ricardo%5D&utm_campaign=0a058e1b40-07out2014newsletter&utm_medium=email&utm_term=0_a39ff6e1ce-0a058e1b40-406050365&mc_cid=0a058e1b40&mc_eid=0c350abc0a

Muito proveitosa será, ainda, a leitura da Encíclia Supremi Apostolatus Officio, de ninguém menos do que o colossal Papa Leão XIII. Sempre ele a distinguir os sinais dos tempos!

http://www.vatican.va/holy_father/leo_xiii/encyclicals/documents/hf_l-xiii_enc_01091883_supremi-apostolatus-officio_po.html





sábado, 4 de outubro de 2014

MEUS CANDIDATOS (MINAS GERAIS)

Amigo leitor,


Para o caso de lhe ser útil, trago ao seu conhecimento os meus candidatos. Voto em Minas Gerais:


45 - Aécio Neves (Presidente)
45 - Pimenta da Veiga (Governador)
456 - Antônio Anastasia (Senador)
3133 - Marcelo Aro (Deputado Federal)
31333 - Claudio Maciel (Deputado Estadual)


Boa eleição!



quinta-feira, 2 de outubro de 2014

CHEGOU A HORA, AMIGO LEITOR!

 
Prezado amigo leitor,
 
 
Chegou a hora das eleições. Reconheço que não sou exatamente um exemplo de temperança e de ponderação, mas gostaria mais uma vez de dirigir-me a você, sugerindo-lhe um especial cuidado, uma especial atenção nessas eleições. Sei muito bem que minha opinião não é digna de crédito, por isso mesmo tenho me aconselhado com pessoas mais sábias e mais doutas. É o resultado que colhi dessas conversas que trago hoje a você.
 
 
Estamos à beira de uma ditadura socialista. Se nós permitirmos que o Partido dos Trabalhadores continue no poder, só com muito custo o tiraremos do poder. Esse partido é cúmplice de regimes ditatoriais e homicidas como os de Cuba, da China, da Rússia e de alguns segmentos islâmicos. É cúmplice de regimes ditatoriais e violadores dos direitos humanos como os da Venezuela, do Equador e da Argentina, que perseguem a imprensa, a Igreja e seus adversários políticos. O PT só respeita os direitos humanos de quem pertence à esquerda, ignorando que a liberdade de crença, de pensamento e de filiação política são universais, conferidos a todo e qualquer ser humano.
 
 
O Partido dos Trabalhadores vem corroendo todas as instituições do país: o Parlamento, o Judiciário, a Petrobrás, os Correios e, pasme!, até a CNBB e segmentos da Igreja, com o marxismo revestido de teologia e de falsa preocupação com os pobres, chamado de teologia da libertação, representada, por exemplo, por Leonardo Boff e por Frei Betto, ambos favoráveis ao aborto e ao casamento 'gay'.
 
 
Lembremo-nos de que prestaremos contas do nosso voto a Deus. Que o nosso voto deve visar não somente ao bem material das pessoas, mas também o bem espiritual e sobrenatural das almas. Não podemos votar em partidos que envenenam a sociedade e destroem as famílias, disseminando políticas imorais e anticristãs, favorecendo o homossexualismo, a intolerância religiosa, o homicídio de pessoas ainda não nascidas, o desrespeito para com as coisas sagradas, a prostituição e o sexo livre.

 
Por isso, caro amigo, gostaria de pedir o seu voto para Aécio Neves, Pimenta da Veiga, Antônio Anastasia. Concordo com você que eles talvez não sejam os candidatos ideais, mas temos obrigação de eleger os menos ruins. A ideologia que eles seguem é liberal, não é a mais correta, mas pelo menos não é anticristã e avessa ao cristianismo como o socialismo do PT, PV, PSB, PSOL, PCdoB, PCO, entre outros. A teologia católica obriga-nos, quando não há saída, a escolher o mal menor.
 
 
Se gozo um pouco da sua confiança, leve em conta o meu pedido. Não anule seu voto. Não vote em branco. Isso favorece os piores candidatos.
 
 
Por fim, para deputado federal em Minas Gerais, sugiro meu amigo, Marcelo Aro, meu correligionário do PHS, cujo número é 3133.
 
 
Deus nos abençoe e nos guarde. Cubra-nos o manto de Nossa Senhora do Rosário. Defenda-nos nosso Pai São José. Inspirem-nos nossos anjos da guarda.
 
 
Tiradentes, 2 de outubro de 2014.
 
 
Paul Medeiros Krause
 
 
 
 
 

quinta-feira, 18 de setembro de 2014

QUEREM OBRIGAR-NOS A NOS TRAVESTIRMOS


O leitor mais atento já terá percebido que nossos jornais e muitos formadores de opinião têm pela liberdade de pensamento e de crença o mesmo apreço que Hitler nutria pelos judeus. Sim, porque o seu discurso é tolerante apenas na aparência; a consequência prática do que eles sustentam é a negação absoluta, o total aniquilamento da livre manifestação do pensamento.

Número não negligenciável de formadores de opinião quer obrigar os cristãos a ser travestis intelectuais. Dizem eles que os que professam uma fé religiosa não podem deixar-se "contaminar" por suas crenças quando forem manifestar uma opinião política, quando forem contribuir para uma deliberação estatal. Exigem dos crentes uma curiosa espécie de neutralidade (que, na verdade, seria uma contradição interna), sendo que eles próprios não se despem das suas convicções não neutras ao opinar. Propugnam uma espécie de estupro ou violação intelectual: o crente, o que adere a uma denominação religiosa, deve negar-se a si mesmo, deve violentar sua própria identidade, deve cindir-se ao meio, despir-se de suas convicções e aderir ao modo de pensar materialista desses formadores, quando for manifestar-se sobre aborto e casamento 'gay', por exemplo. Os crentes teriam de travestir-se de ateus ou agnósticos. Somente o ateísmo prático poderia nortear-lhes a expressão do pensamento. Teriam de consentir em uma espécie de violação, de estupro mental. Teriam de renunciar à própria mentalidade e tomar de empréstimo a mentalidade deles.


É compreensível que pessoas de inspiração materialista nutram pouco apreço pela religião. O que não é compreensível é que algumas delas (não podemos generalizar!) nutram pouco apreço pela liberdade de crença e de manifestação do pensamento. Se só há tolerância para os que pensam de forma igual, que tolerância é essa? Algumas daquelas pessoas revelam uma índole autoritária tão arraigada, tão inconcebível, que só lhes é possível admitir que os crentes pratiquem a sua religião sem acreditar nela, sem levá-la às últimas consequências, exclusivamente dentro do templo e mesmo assim desde que o sermão não seja politicamente incorreto.


Ora, meus amigos. O cristianismo não é uma roupa que se põe e que se tira ao sair ou entrar em prédios públicos. Não é uma espécie de capa que se pendura em um cabide na entrada do parlamento ou dos tribunais com o fim de não contaminá-los com a superstição. Não podemos admitir que nos imponham essa rachadura, esse partir ao meio, essa contradição, de ser cristão no templo e ateu na Câmara dos Deputados. Não nos obriguem às negações de São Pedro: "Não o conheço!" Não podemos admitir que nos obriguem a renunciar a Jesus Cristo e a seus preceitos quando formos emitir uma opinião política. O Estado não pode impor-nos tal alienação mental, tal dicotomia de vida, tal insinceridade com nós mesmos. E aqui devemos lembrar-nos da túnica de Cristo.


O cristão não é um homem de duas faces. Ele deve ser íntegro, inteiro, o mesmo, em toda parte, na igreja, no clube, no bar, em casa, no parlamento e no fórum. Ele não deixa Cristo para trás na escadaria do palácio de governo ou do tribunal. Ele não é um ser desintegrado, dividido, desconjuntado e desconexo, sem identidade. O voto cristão não é um voto cristão apenas na forma. O é também no conteúdo, nas motivações e objetivos. O cristão deve ser como a túnica de Cristo, tecida em peça inteira, sem costura, sem remendos. A mesma túnica Cristo vestia nas suas pregações e diante de Pilatos.


Paul Medeiros Krause

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

A HORA É GRAVE


 

Caro leitor, estamos a poucos dias das eleições presidenciais. Não sei se todos se aperceberam da gravidade da situação em que nos encontramos. Um passo em falso do eleitor agora poderá ser fatal. Estamos à beira de uma tragédia anunciada. Há um processo de cubanização, de venezualização, do Brasil claramente em curso. O Estado brasileiro, a passos largos, tem se transformado em um estado ditatorial, com cerceamento das liberdades de pensamento e de crença. Se o eleitor desperdiçar seu voto em outubro, este processo tornar-se-á irreversível, pelo menos a curto e médio prazo. Custará sangue. Reclamará dores. Exigirá mártires.

 

Certos sofrimentos parecem ser um castigo do céu. Se fôssemos mais dóceis à vontade de Deus, se estivéssemos mais unidos a Ele, ficaria mais claro o que é melhor para nós. Por isso, gostaria hoje de convidar o leitor, mais do que a votar bem, a um processo de conversão. Ao convidá-lo, tento estimular também a mim mesmo, pois dependo urgentemente de seguir pelo bom caminho, de voltar para casa.

 

Nossa Senhora em todas as aparições recentes tem recomendado, tem exigido, a recitação do santo rosário, pelo menos a recitação do terço diariamente. Ora, se a Mãe de Deus nos pede tal coisa, como algo urgente, como algo imprescindível à salvação do mundo, será que temos o direito de ignorá-lo?

 

Acabo de retornar de uma viagem à Espanha. Tive o privilégio de visitar Salamanca, Alba de Tormes, Toledo e Ávila, quatro cidades teresianas. A Espanha, país de tantos e tão grandes santos, tem hoje igrejas vazias. Pelo menos no microcosmo em que me encontrei, quase só vi idosos nas missas e, mesmo assim, em reduzido número. Parece haver ortodoxia no clero, mas falta-lhe vida, fogo, vigor, entusiasmo, paixão. Ali a fé parece ter se cansado, tornando-se quase exclusivamente um dever burocrático. Não se trata mais do amor apaixonado por uma Pessoa que continua no meio de nós.

 

No Brasil, em muitas partes falta ortodoxia ao clero, fidelidade ao Papa e ao Magistério. Contudo, nossas missas são cheias e estão repletas de jovens. O catolicismo no Brasil ainda é uma força pulsante. Infelizmente, há também relações promíscuas de membros do clero, de setores da CNBB, com partidos de esquerda, o que revela uma crise de identidade, pois catolicismo e socialismo são duas coisas totalmente incompatíveis.

 

Entretanto, não estamos sós. Deus está conosco. Nossa Senhora prometeu sua ajuda a quem rezar o rosário. Será que estamos pedindo? Será que estamos invocando o auxílio de Deus para as próximas eleições? Será que estamos convencidos de que pôr os joelhos no chão é indispensável nessa hora dramática? Pouco adianta o nosso inconformismo anão, a nossa histérica revolta de Facebook. O caso é grave. É gravíssimo. É preciso rezar e agir. Agir muito. Partir para o convencimento homem a homem. Um a um. Mas sobretudo rezar.

 

Peçamos a Deus que não nos entregue a nós mesmos. Que não nos puna, que não nos entregue à nossa própria sorte, ao castigo que justamente merecemos. Por enquanto, ainda temos liberdade para falar algumas coisas, contudo, se o processo evidente de implantação do socialismo no Brasil continuar, haverá perseguições, prisões, mártires, choro e ranger de dentes.

 

O Estado ideológico não admite o debate. Ele tenta tomar o lugar da nossa consciência, aniquilando a nossa própria ética e o nosso senso moral. O Estado ideológico parte para a imposição truculenta e para a criminalização das opiniões divergentes. Imiscui-se em assuntos eminentemente privados, penetrando na vida familiar e na privacidade dos indivíduos. Até quando fecharemos os olhos para o que se passa em Cuba, na Venezuela, no Equador, na Argentina? Até quando seremos omissos? Tentaremos gritar somente depois de nos cortarem as gargantas?

 

Parece que não estamos percebendo que, em países vizinhos e alinhados ideologicamente ao partido que está no poder, os veículos de comunicação que manifestam discordância do governo são fechados, sendo a própria discordância criminalizada. Políticos de oposição são perseguidos e presos, pura e simplesmente por contestarem a “verdade oficial”. A incursão do Estado na vida privada dos indivíduos com a “Lei da Palmada”, com a tentativa de criminalização das opiniões discordantes do homossexualismo travestida de combate à homofobia deveria levar-nos a refletir mais detida e seriamente.

 

A alternância no poder nas próximas eleições é crucial. É questão de vida ou morte. Muitos já concluíram que, se o partido que se encontra no poder for reeleito, a única solução poderá ser deixar o país e tentar a vida no estrangeiro. Nós temos a possiblidade ainda de reverter um nefasto processo que está em curso e adiantado. Ditaduras não se implantam do dia para a noite. Elas vão nascendo e mostrando as garras aos poucos, silenciosamente. Alimentam-se da nossa frouxidão. Se deixarmos passar esta oportunidade que a providência de Deus nos oferece – as próximas eleições –, poderá ficar tarde demais.

 

Façamos tudo o que estiver ao nosso alcance. Servindo-nos dos meios ascéticos, especialmente da recitação contínua do terço, tentemos convencer homem a homem. Deus fará o resto.
 


Paul Medeiros Krause

sábado, 30 de agosto de 2014

CONVENTO DOMINICANO DE SANTO ESTÊVÃO EM SALAMANCA



Os guias não o mencionam com tanta ênfase, mas o Convento dominicano de Santo Estêvão de Salamanca é a segunda mais bela atração da cidade, perdendo apenas para a esplêndida catedral. Trata-se de um convento de proporções colossais, do século XVI, e em que se confessava Santa Teresa enquanto morou em Salamanca, fundando uma de suas casas, um dos Monastérios Carmelitas Reformados. Não pude fotografar, mas lá é indicado o confessionário que ela utilizava.




 
 
 

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

SÃO JOSÉ DE ÁVILA

O Convento de São José de Ávila, o primeiro e mais importante dos fundados por Santa Teresa de Jesus, em sua reforma do Carmelo, após a Missa Solene de comemoração dos 452 anos de fundação, ocorrida em 24 de agosto de 1562, dia de São Bartolomeu, apóstolo.

Os santos são no céu como foram na terra. Na foto, são José se mantém na penumbra, na escuridão, assim como se manteve no evangelho e em toda a sua história, para que só Cristo aparecesse.

sexta-feira, 22 de agosto de 2014

SALAMANCA



Estou de férias em Salamanca e só tenho a dizer que a sua beleza ofende, pesa, machuca e dói.

 


quinta-feira, 7 de agosto de 2014

O PECADO MORTAL



Espero ainda viver muitos anos, embora só Deus saiba que dia serei chamado a comparecer perante o seu tribunal, que é, a um só tempo, tribunal de justiça e tribunal de misericórdia. Creio até que se trate mais de tribunal de misericórdia, mas não daquela bagunça que alguns imaginam, que elimine o inferno e empurre para o paraíso os que se obstinam no pecado contra o Espírito Santo, em suas duas formas clássicas: o desespero e a presunção. Como não sei quanto tempo me resta, gostaria de chamar a atenção do leitor para um tema de especial relevância: o pecado mortal.

 

Faço-o em razão da gravidade do tema e da sensação de que me incumbe pessoalmente suprir uma lacuna que percebo nos meios em que gravito ou circulo. Se eu não falar, quem falará? Se eu não o avisar, quem o avisará? Tenho especial aversão aos pecados por omissão. Eu não gostaria que alguma alma se condenasse por uma omissão minha. Dar-me-ei por inteiramente satisfeito se pelo menos uma pessoa for auxiliada a escapar da condenação eterna ao ler este texto.

 

Por vezes, tenho a sensação de que o ser humano tem a estranha capacidade de ocupar-se de bagatelas, de olvidar o essencial. Vejo tantas pessoas se deleitando com o mundo, se lambuzando com o século como se ele fosse definitivo, passeando pelos shoppings como se eles fossem o sétimo céu, que isso só faz agravar a minha preocupação com a salvação das almas, especialmente da minha, igualmente mergulhada neste oceano de frivolidades. Parecemos milhões e milhões de sonâmbulos que se movem num mundo de sonhos, sem distinguir o mundo real.

 

Há uma frase, creio que de Dom Bosco, de quem eu possuo um quadro pendurado na parede do meu quarto, que diz: “Quem se salva, salva tudo; quem se perde, perde tudo”.

 

Pois bem, leitor. Se quem se salva, salva tudo, e quem se perde, perde tudo, que é necessário para salvar-se? Que pode levar-nos à perdição eterna?

 

Para salvar-se é preciso estar na graça de Deus, na graça santificante, na amizade com Deus. Trazer a veste batismal, a veste da graça. A nudez de Adão e Eva após o pecado original é a mais radical que pode existir: a nudez de uma alma sem o Espírito Santo, sem a vida divina habitando nela. Essa nudez é a maior de todas as desgraças, diria até que é a única desgraça, pois quem se salva, salva tudo.

 

Diante isso, é preciso ter bem claro que o homem só possui um verdadeiro inimigo sobre a terra: o pecado mortal. O pecado venial adoece, arranha, prejudica a vida divina em nossa alma, diminui a graça em nossa alma, mas não a elimina, não a mata. O pecado venial não condena ao inferno, o mortal, sim. As tentações do demônio podem até fazer-nos progredir na vida espiritual, se a elas resistimos, mas o pecado mortal nos arruína totalmente.

 

Que é o pecado mortal? É uma transgressão grave da lei divina, consciente e livre. Ele exige três requisitos: 1.º) que se trate de matéria grave; 2.º) pleno conhecimento; e, 3.º) pleno consentimento. Sem um dos requisitos, de mortal o pecado passa a venial.

 

Para verificar-se se algo é matéria grave é preciso consultar o Catecismo da Igreja Católica. Costuma-se dizer que matéria grave consiste em transgressão a algum dos dez mandamentos. Isso não deixa de ser verdade, mas nem sempre é suficientemente claro para esclarecer a consciência do fiel. A doutrina da Igreja explicita para nós o que é matéria grave. Daí a necessidade de consultar-se o catecismo ou outros documentos do Magistério ou então um confessor bem formado.

 

Obviamente, o fiel não poderá alegar ignorância diante de Cristo, se possuía os meios de conhecer a gravidade de um pecado e deixou de fazê-lo propositadamente.

 

Quem se encontra em pecado mortal, se morrer sem se arrepender, será condenado ao inferno. Até o último instante a pessoa poderá arrepender-se, mas deve tratar-se de arrependimento autêntico, arrependimento válido, de contrição perfeita. Se nos acostumarmos a viver nesse estado de pecado e formos surpreendidos pela morte, quem nos garantirá que teremos uma contrição perfeita na hora da morte? Não basta a atrição, ou contrição imperfeita, que surge pelo medo da pena, pois ela não perdoa pecados. Muitos santos testemunham que nesse crucial instante da morte é que nós seremos mais tentados pelo demônio, pois trata-se da hora decisiva, em que ele ganha ou perde mais uma alma, invejoso que é e desejoso da perdição do homem.

 

Será por alguma razão ociosa que em todas as Ave-Marias invocamos a proteção de Nossa Senhora para o momento de nossa passagem ao outro mundo?

 

Se, pois, acontecer-nos de morrer sem confissão, temos o último recurso do ato de contrição perfeita, do arrependimento perfeito, que é o que se faz sem qualquer interesse, sem desejo do céu, sem temor do inferno, mas exclusivamente por amor a Deus, sentindo pesar de ter ofendido quem é tão bom.

 

Convém, porém, que não nos fiemos nisso e preparemo-nos desde já para uma boa morte, servindo-nos de todos os meios que a Igreja põe à nossa disposição: confissão mensal, comunhão frequente, vida de oração e mortificação. Sem a frequência aos sacramentos, sem a força de Deus que vem da oração, sem a mortificação que fortalece a nossa vontade para o combate das tentações, como venceremos? Lembremo-nos de que o demônio não dorme e que é uma criatura angélica, mais forte do que nós. Para vencê-lo, precisamos que Deus nos empreste a sua força, que nos vem por esses canais, por esses meios.

 

Já há algum tempo eu queria escrever este texto para alertar aqueles que vivem em perigo objetivo de condenação. Para aqueles que vivem permanentemente em pecado mortal, em situação de pecado grave, adiando a regularização da sua vida espiritual. Só Deus sabe se, afinal, você se condenará, mas vale a pena correr o risco de perder tudo? De que terá adiantado o prazer sexual ilícito de quinze minutos diante do tormento eterno? De que terá valido um gozo momentâneo, seja lá de que natureza for, um prato de lentilhas, diante da eternidade? Um átimo em relação ao tudo?

 

Quero dirigir um alerta especial, pois, aos que vivem em situação irregular perante a Igreja, com vida sexual fora do matrimônio (sejam solteiros, casados ou separados), aos casais regularmente unidos pelo sacramento do matrimônio mas que fazem uso de métodos anticoncepcionais artificiais ou recorrem a métodos de fecundação artificial (bebês de proveta), aos que perdem missa aos domingos e em dias santificados. Tudo isso é matéria grave. Ao conhecermos o que a Igreja diz a respeito desses assuntos, transgredindo seus ensinamentos, nós nos encontramos em perigo objetivo de condenação. Por que eu digo objetivo? Porque a nossa responsabilidade, a nossa culpa subjetiva, eventuais atenuantes, somente Deus conhece. Mas, repito, em assunto tão grave, tão fatal, tão decisivo, vale a pena expor-nos ao risco?

 

Eu nem quero falar dos que, em estado de pecado mortal, recebem a comunhão. Por exemplo: dos casais descasados em segunda união, dos que utilizam métodos anticoncepcionais artificiais, dos que têm vida sexual antes ou fora do casamento e comungam. Aí há um acréscimo de malícia, há um sacrilégio, comunhões sacrílegas. Deus nos livre disso! São Paulo diz que quem recebe o Corpo e o Sangue do Senhor sem estar preparado, come e bebe a própria condenação. Não façamos isso!

 

São Francisco de Sales traz-nos um ensinamento que pode estimular-nos a não desanimar a recorrer sempre à confissão para voltar à graça de Deus após uma queda. Diz ele, no “Tratado do amor de Deus”, que todas as nossas boas ações perdem seu mérito sobrenatural, perdem seu valor, quando cometemos um só pecado mortal. Tais boas ações podem até ter algum valor humano, de civilidade, conter alguma vantagem temporal. Mas, vindo à alma um pecado mortal, elas perderam todo o seu valor para nos ajudar a conquistar o paraíso e para o aumento da nossa glória no céu.

 

O pecado mortal é como o ocorrido com aquele homem que descia de Jerusalém a Jericó. O verbo “descer” dá bem a ideia de queda, de declínio espiritual. De pecado venial em venial, o viajante chegou ao mortal. O homem foi assaltado e deixado como morto na beira da estrada. Assim faz o demônio, espanca-nos, mata-nos e saqueia todos os bens espirituais que trazíamos em nossas almas.

 

Mas aí está a beleza do que São Francisco de Sales diz em seguida: retornando a alma à graça de Deus, Deus restitui o valor sobrenatural a todas as boas obras passadas do penitente. Aquelas boas obras tornadas mortas porque o ramo se separou da videira, tornam a ser vivificadas quando o ramo volta a unir-se à videira verdadeira e a seiva volta a circular por ele.

 

Os cuidados dispensados ao ferido pelo bom samaritano podem bem representar a Igreja com os cuidados dos sacramentos, que curam, vivificam, restabelecem a saúde dos pecadores. O pai restitui integralmente a dignidade do filho pródigo, do filho que estava morto: devolve-lhe o anel, o calçado, dá-lhe roupas novas, a alegria da festa, boa comida e boa bebida. Devolve-lhe seu antigo tesouro. Todas as boas obras antigas do filho pródigo renascem.

 

Pois bem, caro leitor. Dirijo-me a você não como um cumpridor da Lei de Deus, mas como quem, cambaleando ali e tropeçando aqui, caindo acolá, quer contar com o auxílio das suas orações, a fim de que nós nos ajudemos reciprocamente a vencer essa árdua batalha espiritual contra o pecado.

 

 

 

 

Paul Medeiros Krause

quarta-feira, 30 de julho de 2014

NOVENA A SÃO DOMINGOS – 9.º DIA – 7 DE AGOSTO: AMOR AOS SEUS FILHOS



 
* Nossa Senhora e o Menino, São Domingos e Santo Tomás, de Fra Angelico.

 

ORAÇÕES PARA ANTES DA LEITURA

 

 

Vinde, Espírito Santo, enchei os corações dos vossos fiéis e acendei neles o fogo do vosso amor.

 

V. Enviai, Senhor, o vosso Espírito e tudo será criado.

 

R. E renovareis a face da terra.

 

Oremos: Ó Deus, que instruístes os corações dos vossos fiéis com as luzes do Espírito Santo, fazei que nos regulemos pelo mesmo Espírito e gozemos sempre das suas consolações. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que é Deus convosco na unidade do Espírito Santo.

 

R. Amém.

 

Dulcíssimo Pai S. Domingos, tende compaixão dos aflitos, dos pobres peregrinos e desterrados do Céu, não desprezeis as nossas humildes súplicas, mas livrai-nos de todos os perigos e, pelas vossas santas orações, transportai-nos para o Reino da segurança e da paz.

 

V. Bom Jesus, pela oração de Domingos,

 

R. fazei que nos tornemos agradáveis a vossos olhos.

 

Oremos: Concedei-nos, Deus Onipotente, Vos pedimos, que os exemplos do glorioso Patriarca S. Domingos nos levem a uma vida melhor, a fim de que, honrando a sua memória, imitemos também as suas virtudes. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que é Deus convosco na unidade do Espírito Santo.

 

R. Amém.

 

 

LEITURA

NONO DIA

 

AMOR DE S. DOMINGOS AOS SEUS FILHOS

 

 

S. Domingos amava a todos e de todos era amado, exceto dos inimigos da Igreja; mesmo para estes, porém, tinha palavras fraternas e exortações caridosas. Mostrava-se sempre amável, simples e alegre: “Ninguém mais afável, ninguém mais jovial. O seu rosto brilhava com uma luz doce e amável, e nada perturbava a tranquilidade da sua alma; mas comovia-se perante a miséria do próximo”, no dizer do Beato Jordão.

 

Não chegou ele a vender os manuscritos, os livros e tudo o que tinha, quando ainda estudante em Palência, para socorrer os pobres famintos?! “Não quero – dizia ele – estudar em peles mortas, quando há homens que morrem de fome”. Uma outra vez chegou a oferecer-se para ser vendido, a fim de libertar um homem cuja extrema pobreza era o obstáculo principal à sua saída do cativeiro.

 

Estimava e amava todas as Ordens religiosas e queria que seus filhos partilhassem essa estima e amor. Mas era bom particularmente para com os seus filhos.

 

Nas tentações e aflições não havia melhor consolador. Cheio de solicitude, interrompia, de noite, as suas orações e ia ver se os irmãos descansavam bem. Nas viagens era severo para consigo, mas dispensava facilmente os outros. Sóbrio para si, queria que os outros fossem abundantemente servidos. Os hábitos que lhe davam distribuía-os pelos irmãos.

 

Quando via algum irmão cometer uma falta, não lhe poupava o castigo, mas afligia-se por se ver obrigado a castigar, e fazia-o com palavras e maneiras tão suaves e tão humildes que todos se retiravam consolados.

 

Quantas vezes não fez o Senhor milagres, a pedido de Domingos, para vir em auxílio de seus filhos, quer no espiritual, quer no temporal. Por duas vezes faltou o pão no refeitório, mas apareceram dois belos jovens, que colocaram diante de cada religioso um pão e figos.

 

Uma noite, um anjo guiou S. Domingos através das ruas de Roma, desde S. Xisto até Santa Sabina, para impedir um noviço de fugir do convento.

 

Bastava, muitas vezes, fazer apelo ao seu coração compassivo para que S. Domingos, apesar da sua grande humildade, pedisse a Deus um milagre.

 

Dispersava, semeava, por assim dizer, os irmãos pela Europa, não obstante o conselho contrário de pessoas ilustres e amigas, para fundar conventos; enviava outros a pregar, embora pouco dotados, dizendo-lhes: “Ide com confiança porque o Senhor vos inspirará o que haveis de dizer”. E tudo lhes corria bem, porque Domingos os acompanhava com as suas orações.

 

Na sua última doença, chamou para junto de si os noviços. Consolou-os e exortou-os ao bem com palavras doces e amáveis e rosto sorridente.

 

Durante a sua agonia, alguém lhe diz: “Pai, sabeis em que desolação nos deixais; lembrai-vos de nós e orai por nós junto do Senhor”.

 

Então ele, levantando os olhos ao céu, orou: “Pai santo, Vós sabeis como me tenho aplicado a fazer a vossa vontade, e aqueles que me destes Eu os guardei e conservei. Eu vo-los confio, por minha vez. Conservai-os e guardai-os”.

 

Como alguns religiosos insistissem, ele declarou-lhes: “Ser-vos-ei mais útil e vos ajudarei mais eficazmente após a minha morte do que durante a vida”. E, com efeito, os seus filhos têm, durante os séculos, sentido a realização da sua promessa. S. Domingos, numa conversa confidencial com um religioso da Ordem de Cister, disse-lhe: “Confesso-vos que nunca, em toda a minha vida, pedi alguma coisa a Deus que Ele me recusasse”.

 

Tenhamos confiança no Santo Patriarca. Ele foi um grande servo de Deus e, por conseguinte, goza de grande poder de intercessão. Junto de Jesus e Maria ele segue todos os passos da nossa vida e, como é bom pai, está pronto a interceder sempre por nós.

 

Sejamos dignos dele, procurando imitá-lo e reproduzi-lo na nossa vida, para merecermos, um dia, ser colocados debaixo do manto de Maria.

 

 

ORAÇÃO PARA DEPOIS DA LEITURA

 

Louvado seja o nosso Redentor, que, querendo salvar todos os homens, deu ao mundo S. Domingos de Gusmão.

 

V. Coração de Jesus, abrasado de amor por nós.

 

R. Abrasai o nosso coração de amor por Vós.

 

Oremos: Senhor Jesus Cristo, que dissestes: pedi e recebereis, procurai e achareis, batei e abrir-se-vos-á, nós Vos pedimos, pelos méritos do vosso fiel servo Domingos e de vossa Mãe Santíssima, protetora e advogada da Ordem, e pela bondade inesgotável do vosso Coração, nos concedais as graças que humildemente Vos pedimos nesta novena, para que, seguindo fielmente os vestígios do nosso glorioso Patriarca S. Domingos, possamos com ele louvar-Vos e glorificar-Vos por toda a eternidade.

 

R. Amém.

 

 

RESPONSÓRIO DO PATRIARCA S. DOMINGOS

 

 

R. Oh admirável esperança, que destes aos que na hora da vossa morte choravam a vossa ausência, prometendo-lhes que, depois dela, havíeis de ser-lhe mais útil! Cumpri, ó Pai, o que prometestes, ajudando-nos com os vossos rogos.

 

V. Vós que resplandecestes com tantos milagres nos corpos dos enfermos, trazei-nos o socorro de Cristo, curai-nos da perversidade e corrupção dos costumes.

 

R. Cumpri, ó Pai, o que prometestes, ajudando-nos com os vossos rogos.

 

V. Glória ao Pai e ao Filho e ao Espírito Santo.

 

R. Cumpri, ó Pai, o que prometestes, ajudando-nos com os vossos rogos.

 

V. Rogai por nós, Bem-aventurado Pai S. Domingos.

 

R. Para que sejamos dignos das promessas de Cristo.

 

Oremos: Ó Deus, que Vos dignastes iluminar a santa Igreja com os merecimentos e a doutrina do Bem-aventurado Domingos, vosso confessor e nosso Patriarca, concedei-nos, por sua intercessão, a graça de sermos socorridos nas necessidades temporais e de crescermos sempre mais nos bens espirituais. Por Nosso Senhor Jesus Cristo.

 

R. Amém.

 

 

 

Fonte: Novena a S. Domingos. Vários autores. 2. ed. actualizada. Editorial Apostolado do Rosário: Fátima (Portugal), 2006.