quarta-feira, 31 de julho de 2013

A ESCRAVIDÃO DO ANENCÉFALO

Lamentavelmente, o homem costuma repetir os mesmos erros do passado. Muitos se indignam, por exemplo, com o fato de a escravidão do negro já ter sido admitida. A indignação é louvável e justíssima; o problema é não enxergar a escravidão – na verdade, algo muito pior – acontecendo em nossos dias.

O assassinato silencioso de homens e mulheres inocentes no ventre de suas mães – sim, assassinato que alguns tentam dissimular por meio de malabarismos semânticos como o uso da expressão “interrupção da gravidez” – é algo de que nos envergonharemos brutalmente no futuro. Ele é uma chaga aberta da sociedade atual.

No Brasil, não há mais Estado de Direito. E isso desde que o Supremo Tribunal Federal, por oito votos contra dois, decidiu que o anencéfalo é um ser humano de segunda categoria, cujo direito à vida é inferior a um suposto direito de bem estar psíquico de suas mães. Observe-se, porém, que esse suposto direito de bem estar psíquico é também uma falácia, pois os relatos de mães que levaram a termo a gravidez de anencéfalos é de grande serenidade, de paz e sensação de dever cumprido.

Várias objeções podem ser feitas à decisão do STF. Em primeiro lugar, ele usurpou competência do Congresso Nacional, atuando como legislador positivo e criando hipótese de aborto eugênico não prevista pela lei.

Além de usurpar competência do Congresso Nacional, a inovação legislativa promovida pelo STF – aliás, contrária à vontade da população – atenta contra a Constituição, visto que o direito à vida, agasalhado pelo seu art. 5.º, não possui condicionantes ou adjetivos: a Constituição protege a vida, não a “vida viável”, “a expectativa de vida” ou “a vida de qualidade”. Isso sem falar em que seria temeridade enveredar por definir o que seja “vida viável”, “expectativa de vida” (dias, meses ou anos?) ou “vida de qualidade”. A medicina não é ciência exata. Mas o STF entendeu que o anencéfalo não é uma “vida de qualidade”.

Se no passado houve um grupo de homens – utilizo a palavra “homens” no sentido de ser humano – destituído de praticamente todo e qualquer direito, os escravos, hoje surge novo grupo de homens considerados de segunda categoria: os nascituros e, no específico caso dos anencéfalos, as “vidas sem qualidade”.

Já tive oportunidade de dizer que o entendimento do STF equivaleria a afirmar que um homem, um ser humano, é determinado por uma régua escolar: 10 cm de cérebro, 15 cm disso ou daquilo. Ora, isso é eugenia. Não é o tamanho do cérebro que define o que é o homem. O que define um homem é ser um indivíduo da nossa espécie.

Dizer que o anencéfalo é um ser morto constitui uma falsidade gritante, visto que ele apodreceria dentro do ventre materno, gerando inúmeras complicações de saúde, coisa que não ocorre. Tanto não ocorre que não é invocado, no caso do anencéfalo, o inciso do Código Penal que trata do aborto terapêutico, isto é, o que é realizado para salvar a vida da mãe.

Demais disso, alguns outros pontos chamam a atenção no debate sobre a legalização do aborto (a questão do anencéfalo é apenas o dedo mindinho da discussão). As feministas reivindicam um direito próprio; um suposto direito de autodeterminação sexual, de bem estar psíquico e de fazer o que quiserem com o seu corpo.

Não obstante, a própria existência do Poder Judiciário e das regras de impedimento e suspeição existentes no direito processual demonstram que ninguém é bom juiz da própria causa. Por mais idônea que seja a parte interessada, ao defender um direito (ou suposto direito) próprio, entra o componente passional, que compromete um juízo isento, imparcial.

Por essa razão, os argumentos feministas devem ser tomados com extrema cautela, porque são passionais e desviam o foco da discussão.

Por outro lado, os que se opõem à legalização do aborto defendem direitos de terceiros, não estão atuando em causa própria. Só por aí começam a levar vantagem sob o aspecto da imparcialidade. Não há, no caso, motivações egoísticas, mas motivações altruístas. Os defensores dos homens não nascidos protegem direitos de terceiros.

Outro aspecto, é que os abortistas, em regra, utilizam malabarismos, contorcionismos verbais, temendo que o público compreenda qual é o fenômeno real que se passa: o derramamento brutal de sangue humano inocente. Ao invés de o Estado colocar o seu aparato a serviço e na defesa dos seres humanos mais indefesos, os nascituros com má-formação (essa é a lógica do Estado de Direito!), ele faz exatamente o contrário: se põe do lado do mais forte (essa é a lógica da barbárie). No confronto entre a mãe e o feto malformado, prefere o Estado optar pelos direitos da primeira, chamando o segundo de “matéria morta”, de “vida sem qualidade”. Isso não é de espantar, pois o negro também já foi considerado uma coisa, mera propriedade do seu senhor. Mas talvez, pelo menos, tenha sido considerado uma coisa viva.

Seria interessante submeter os abortistas a um teste. Gostaria de perguntar-lhes o seguinte: caso vocês estivessem convencidos de que o anencéfalo é um ser humano vivo, a sua opinião sobre o aborto ou interrupção da gravidez de anencéfalos seria diferente? Acredito que não seria. As distinções semânticas utilizadas pelos defensores do aborto destinam-se apenas a facilitar a consecução dos seus objetivos. Para o abortista, não importa tanto o fenômeno real. Ele quer o resultado: a liberação da prática. Ao contrário, para os defensores dos homens em gestação, entender o fenômeno real é imprescindível. Os fatos determinam qual é a regra de direito aplicável.

Por último, fica aos católicos a advertência: é o Presidente da República que escolhe os Ministros do STF. Um voto mal empregado pode resultar em derramamento de sangue. Será que não temos uma culpa gravíssima no caso?
 
 
Paul Medeiros Krause

A CORAGEM DE VIVER ALEGRES

Há duas maneiras de viver: buscando o prazer ou buscando a felicidade. Não que o prazer seja um mal, como se fosse a própria antítese da felicidade. Não quer dizer que onde o prazer entra pela porta a felicidade sai pela janela, como se eles não pudessem conviver sob o mesmo teto. Prazer e felicidade não são autoexcludentes. O prazer é bom, ele possui um sentido, tem uma razão de ser, uma finalidade. Só não deve ser supervalorizado. Ele é acessório, e quem se prende demais ao acessório acaba perdendo o principal. Reformulemos, então, nossa primeira afirmação: há duas maneiras de viver – buscando o prazer, que traz a infelicidade, ou buscando a felicidade, que traz o prazer.

Quem quer que seja honesto consigo mesmo poderá perceber que na nossa alimentação, por exemplo, o prazer facilita, torna agradável e mais estimulante, a busca dos nutrientes necessários ao nosso corpo. Cada um poderá chegar com tranquilidade à conclusão de que o objetivo da alimentação não é fartar de prazer o paladar. A alimentação saudável ordena, poda, mantém dentro dos seus justos limites, o prazer que a comida e a bebida proporcionam.

Essa diretriz pode ajudar-nos nos nossos relacionamentos afetivos. O namoro e o casamento não se destinam a fartar de prazer os nossos órgãos sexuais, mas a alimentar de amor o nosso espírito. Ou o amor não é uma necessidade? Não será ele a nossa maior necessidade imaterial? Haverá felicidade possível sem amor? Talvez haja felicidade sem comida ou sem bebida, alimentos do corpo, mas desconfio seja impossível felicidade sem o alimento do espírito. Se repararmos bem, a busca pelo prazer contém algo de monótono, enfadonho, entediante, enjoativo.

É preciso, pois, ser honesto consigo mesmo e com os outros. Será que em todas as carícias que faço em minha namorada eu a estou buscando? Não estarei buscando a mim mesmo? Será que em certos toques, em certos beijos e abraços, eu estou buscando não a minha namorada, mas o prazer que ela me proporciona? Em outras palavras, ao invés de sair de mim mesmo, de transcender-me para levar um bem a ela, para acrescentar-lhe algo, para acariciá-la de uma forma suave e modesta, eu não estou simplesmente me servindo dela, subtraindo-lhe algo, para estimular meu órgão sexual? Não estarei eu instrumentalizando-a, diminuindo-a, utilizando-a como um simples meio de atingir uma mera sensação física, meu real objetivo?

Já tive várias vezes essa sensação de limite, a percepção desse critério. “Até aqui, eu a estou buscando. Daqui em diante, é a mim mesmo que estou buscando, egoisticamente”. E, instantaneamente, após a enfadonha e egoística busca de mim mesmo, o que eu encontro? A tristeza.

Por um estranho desígnio, quanto mais egoístas somos, quanto mais prazer buscamos, mais amargor sentimos. Dizem que o amor dói. Que só há amor quando dói. Creio ser verdade, pois ele contém a capacidade de sacrificar-se pelo outro. O amor é um sair de si mesmo para acrescentar algo ao outro. O egoísmo só vai ao outro para roubar algo para si mesmo. O prazer, a mera sensação não podem ser buscados como fins. Eles frustram. Decepcionam. São carentes. Ficam na superfície, sobre a pele. Não penetram no interior do homem.

O amor é um generoso doador, distribuidor de dons e de bens. O egoísmo é um ladrão. Rouba o que não é dele. Olha o que não pode. Toca o que não convém. Usurpa o que não lhe pertence.

Viktor Frankl, o fundador da logoterapia, fala muito da necessidade da autotranscendência. Diz ele que o sentido de nossas vidas está fora de nós e é maior do que nós. O amor é essa autotranscendência saudável que dá sentido a todas as coisas, que sai de si e se doa. O egoísmo, fonte de tantas neuroses, é solitário; é uma introspecção tristonha e acabrunhante, que refere todas as coisas a si e não sai do seu quarto.

Convém, pois, que tenhamos a coragem de ser felizes, pondo cada coisa no seu lugar e chamando cada uma pelo seu próprio nome.
 
 
Paul Medeiros Krause

terça-feira, 30 de julho de 2013

A ARMADILHA DO FEMINISMO

Fustel de Coulanges ou Friedrich Engels? “A cidade antiga” ou “A origem da família, da propriedade privada e do Estado”? Sigmund Freud ou Edward Westermarck? Você pode escolher, caro leitor, o que lhe parecer mais convincente. Eu já escolhi.

Cada dia que passa, estou mais convencido de que as ideologias têm prazo de validade. Não me assustam essas tendências de liberação do casamento gay, da adoção por homossexuais, do politicamente correto em matéria sexual ou quejandos, nem essa histeria na defesa do direito das mulheres. Claro, elas, essas tendências, causam um estrago incomensurável na sociedade; o efeito é o de uma hecatombe, de uma bomba nuclear. Mas passa. Vai passar.

Há alguns dias eu dizia que certas teses jurídicas têm o mesmo prazo de validade de um iogurte. O iogurte é conservado artificialmente. Em pouco tempo azeda. E, ainda assim, precisa ser conservado em um ambiente artificial para manter-se. É como o feminismo. Precisa do ambiente refrigerado e artificial da ideologia para manter-se. Precisa daquele quadradinho, daquele retângulo resfriado chamado cosmovisão, peculiar visão de mundo. A ideologia é do tamanho de uma geladeira.

Não sei se todos sabem, mas o feminismo está diretamente ligado ao marxismo cultural, a uma espécie de interpretação da história segundo a qual o casamento, vejam lá o que diz Engels no seu “A origem da família”!, teria sido uma invenção cruel dos machos para expropriar das mulheres a mais-valia, o fruto do seu trabalho. Nesse sentido, o feminismo seria o antídoto para essa situação perversa.

O marxismo cultural não vê distinções reais entre os sexos. Por quê? Porque, como toda ideologia, é furado, é desmentido pela realidade. Para sobreviverem, as ideologias têm de ignorar a realidade. Têm de fingir que ela não existe. Têm de fugir do teste, do confronto com o mundo real. Para acreditar numa coisas dessas, o homem, o ser humano, tem de descrer de seus olhos e de seus ouvidos. Mas há quem o faça. Há pensadores que querem convencer que têm razão, mesmo quando estão errados.

“A cidade antiga”, de Fustel de Coulanges, serve como uma refutação cabal das teses marxistas. Coulanges demonstra como o casamento e a família antigos formaram-se ao redor da religião. E não se trata da religião cristã. Trata-se da religião antiga. A mulher da antiguidade, quando se casava, passava a cultuar o deus do marido. Mudava de religião. Isso nada tinha a ver com a expropriação do trabalho da mulher. O homem antigo não era um capitalista ateu ou agnóstico. Era essencialmente religioso.

Desculpem-me o mau hábito. Gosto um pouco de expressões fortes. O mundo moderno está acostumado a cuspir no senso comum. Alguns inteligentinhos querem convencer-nos de um monte de ideias de plástico. Chesterton, ao falar de Nietzsche, no “Ortodoxia”, diz que quem não amolece o coração acaba amolecendo o cérebro. Há um tipo de conhecimento, de dados, que nos são entregues de presente pela realidade. São dons gratuitos do mundo real. Não precisam ser explicados. Qualquer homem simples do campo, com a luz da sua razão natural, com o uso do senso comum, sabe que homem e mulher são diferentes. Não têm eles o mesmo vigor físico. Não têm a mesma disposição psicológica. Não têm a mesma configuração anatômica. Têm diferentes e complementares órgãos sexuais.

Mas a ideologia politicamente correta, construída a partir de uma junção do marxismo com as teorias psicológicas de Freud, quer convencer-nos do contrário. Os papéis dos sexos não seriam naturais, mas socialmente construídos. Seriam moldados por uma estrutura opressora, de dominação, de poder. É o que diz Herbert Marcuse, autor da frase: “Faça amor, não faça guerra”.

Ora, a mulher não deve pretender ser um outro homem. Ela nunca o conseguirá. Nunca se realizará. A plena realização e a felicidade só são alcançadas quando se busca e se vive a verdade sobre si mesmo. Isso passa pela correta compreensão da própria natureza, da própria sexualidade. Isso exige o uso da razão natural que se pode chamar simplesmente de senso comum, algo que tem sido tão esvaziado, tão difamado e tão pouco compreendido.

Paul Medeiros Krause

"EU SOU A IMACULADA CONCEIÇÃO"

Mal começa um novo ano litúrgico, caro leitor, e tem lugar a Solenidade da Imaculada Conceição de Nossa Senhora, a exatos nove meses do dia 8 de setembro, em que se comemora a Festa da sua Natividade ou nascimento. 

O dogma da Imaculada Conceição (ou Concepção), solenemente proclamado pelo Papa Pio IX, por meio da Constituição Apostólica “Ineffabilis Deus”, em 8 de dezembro de 1854, significa que Maria, ao contrário de todos os outros seres humanos, foi preservada do pecado original desde a sua concepção. Sim, este magnífico privilégio foi-lhe outorgado em previsão dos méritos de Cristo, uma vez que seria uma injúria ao Homem-Deus que a sua própria mãe tivesse estado, ainda que por um instante sequer, sujeita ao demônio, seu inimigo, pelo pecado. Com efeito, todo pecado é uma sujeição ao demônio. A Mãe de Deus não poderia ter estado por algum momento sujeita a ele, pois Deus, infinitamente puro e santo, não tolera a mínima corrupção ou impureza.

Um detalhe curioso a respeito desse dogma é o fato de ele ter sido sobrenaturalmente antecipado por Nossa Senhora das Graças e ratificado, também sobrenaturalmente, por Nossa Senhora de Lourdes. Em 1830, em Paris, Maria, sob o título de Nossa Senhora das Graças, pediu a Santa Catarina Labouré que fizesse cunhar e propagar medalhas (a chamada “medalha milagrosa”) com a inscrição: “Ó Maria, concebida sem pecado, rogai por nós que recorremos a vós”. Em 1858, quatro anos após a proclamação do dogma pelo Papa, que o fez no exercício do seu magistério infalível, isto é, “ex cathedra”, Nossa Senhora confirma pessoalmente o seu acerto, apresentando-se a Santa Bernadete Soubirous, em Lourdes, da seguinte forma: “Eu sou a Imaculada Conceição”.

É preciso reconhecer com a Igreja e com todos os santos, especialmente São Luís Maria Grignion de Montfort, que todas as devoções têm por princípio e fim Jesus Cristo. Mesmo a devoção a Maria não é fim em si mesma. Maria não é fim. Maria é meio. Ela prepara-nos, torna-nos mais dignos, mais humildes, eleva a nossa devoção a Jesus Cristo. A Virgem Santíssima torna-nos menos indignos de apresentarmo-nos a Cristo-Rei, revestindo-nos de seus próprios méritos, que superam os méritos de todos os outros santos juntos.

Maria é a obra-prima da criação. É a obra-prima das mãos de Deus. É a mais excelsa de todas as criaturas. Entre ela e Deus vai uma distância infinita, pois é a distância existente entre criatura e criador. Entretanto, entre as criaturas, não há uma única sequer que se aproxime da sua grandeza. Por isso, a Igreja lhe consagra o amor de “hiperdulia”, que é superior ao amor que devemos aos outros santos e aos anjos, o amor de “dulia”. A Deus, que é criador, devemos o amor de “latria”, que é o de adoração, de reconhecimento da divindade, da onipotência divina.

A mim me parece – frise-se bem, é opinião minha, sujeita a erro – não ser possível conhecer e amar Maria convenientemente sem ler o “Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem”, de São Luís Maria Grignion de Montfort. Não há livro superior a este sobre Mãe de Deus. Este livro é um mistério, um segredo de santidade. Ele opera milagres espantosos, diria até, assustadores. A perfeita escravidão a Maria, devoção explicada nesse tratado, é o meio mais excelente e eficaz para progredir em santidade.

E é por isso, leitor amigo, que eu me atrevo a dizer que esse é o grande livro e essa a grande devoção dos tempos modernos. Não será grande honra pertencer à guarda pessoal de tão boa Rainha? O Rei não destina seus soldados mais valorosos, mais dignos, mais valentes, mais fiéis, para a guarda pessoal e proteção da Rainha? Não será grande coisa ser confidente, homem ou mulher de confiança da Rainha, desfrutar da sua intimidade, conhecer seus segredos, defender a sua honra e aprender com a maravilhosa delicadeza de seus gestos?

Não é por outro motivo que homens de Deus como o Padre Paulo Ricardo e o Padre Rodrigo Maria empenham-se arduamente na divulgação do “Tratado da Verdadeira Devoção” e realizam uma campanha nacional de consagrações à Virgem Maria, que costuma encontrar seu ápice justamente no dia 8 de dezembro, pois é recomendável que essa consagração total, na qualidade de coisa, objeto, escravo perpétuo, ocorra em uma festa mariana.

Assim, hoje, caro leitor, se você ama a Deus de verdade, eu gostaria de pedir-lhe, com todo o ardor da minha alma, diante da gravidade dos dias que correm, que você se consagre à Virgem Soberana. Leia o “Tratado”. Tenho preferência pela tradução da Editora Vozes. Caso você queira, sirva-se da edição da Arca de Maria. Mas leia. Faça a consagração total. Entregue a Maria todos os seus bens materiais e espirituais, passados, presentes e futuros. Confie à administração dela os méritos de todos os seus sofrimentos, preces e boas ações. Entregue à Rainha dos Anjos todas as suas comunhões eucarísticas. Viva essa pobreza – que na verdade é uma extrema riqueza – espiritual. Divulgue o “Tratado”. Estimule outras pessoas a consagrar-se a ela. Não há devoção que o demônio tema tanto. Não há prática que aperfeiçoe tanto a nossa devoção a Cristo.

A escravidão total a Maria faz-nos pertencer à sua descendência de um modo perfeito. E o livro do Gênesis fala-nos: “Porei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e a dela. Esta te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar.” Não há modo mais eficaz de esmagar a cabeça da serpente e todas as suas seduções. Se formarmos um grande exército da Virgem, ela converterá o mundo. “Com Pedro, a Jesus, por Maria”.


Paul Medeiros Krause

AMANHÃ, 31 DE JULHO, DIA DE SANTO INÁCIO

Amanhã, 31 de julho, dia do grande Santo Inácio de Loyola, classificado no livro de René Füllöp-Miller como um dos cinco santos que abalaram o mundo! Recomendo vivamente "Os santos que abalaram o mundo".

O CASAMENTO 'GAY' É ATO INEXISTENTE

Causa estarrecimento a recente resolução do Conselho Nacional de Justiça, de n.º 175, que obriga os cartórios a celebrar o casamento de pessoas do mesmo sexo. Até pouco tempo, não havia dúvidas de que o casamento havido entre pessoas do mesmo sexo era negócio jurídico inexistente.

Já atropelavam a Constituição as decisões judiciais, inclusive do Supremo Tribunal Federal, que reconheciam a existência e atribuíam efeitos jurídicos à união civil entre pessoas do mesmo sexo. Tais decisões, como a recente resolução do CNJ, causam perplexidade e suscitam o questionamento sobre os limites da atuação do Poder Judiciário. Poderá ele reescrever a Constituição, atribuindo-se funções de legislador constituinte, invocando princípios para solapar a letra expressa do texto constitucional? Está correto do ponto de vista técnico fazer prevalecer princípios, cujo conteúdo é sempre maleável, em detrimento da letra expressa do texto constitucional?

Ora, o art. 226, § 3.º, da Lei Maior é de clareza meridiana: “§ 3.º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar a sua conversão em casamento”.

Em outras palavras, nem mesmo a união civil pode se dar entre pessoas do mesmo sexo. Também ela é inexistente aos olhos do direito, por mais que se invoquem princípios de discutível conteúdo, quanto mais o casamento. A dualidade de sexos é elemento essencial da união civil, diz o Constituinte. Coisa diversa é a sociedade de fato, que não constitui entidade familiar, pode ser formada por pessoas do mesmo sexo e ter consequências jurídicas. Casamento gay e união civil entre pessoas do mesmo sexo são construções de vento, ficções, mas não ficções jurídicas, pois nem sequer penetram no mundo do direito.

O Poder Judiciário envereda por caminho perigoso, antidemocrático, totalitário, manietando a ampla discussão que o tema deve ter. Introduz, manu militari, com desprezo da opinião pública e ignorando a atuação do Parlamento, inovações graves no ordenamento jurídico, tão somente com base em princípios, repita-se, de conteúdo discutível, de forte carga ideológica, e contrariamente a texto expresso promulgado pelo Poder Constituinte Originário.

O direito não pode ficar refém de ideologias. Não pode se curvar e estar a serviço de crenças liberalizantes em matéria sexual. Ideologia não se impõe no tapetão. Crenças materialistas não detém, na Constituição, qualquer privilégio em relação a crenças de outra ordem. Na Constituição, materialismo e espiritualismo equivalem-se. Não se impõe materialismo por sentença.

Será que nos apercebemos da gravidade da situação?

Invoca-se a laicidade do Estado, apesar de geralmente haver abuso no emprego desse argumento. Agora, é jurídico decidir com base em princípios quando há texto constitucional expresso, emanado do Poder Constituinte Originário? E os outros princípios expressos da república, do estado de direito, da separação de poderes, da liberdade de pensamento e de crença, da soberania popular? Qual é a sua extensão? Ou invocar a república e o estado de direito comprometem a laicidade do Estado? A separação de poderes é dogma jurídico ou de que natureza? O poder emana do povo ou dos juízes? É o povo quem dá o poder aos juízes, não o contrário.

Tenho para mim que as decisões judiciais que reconhecem a união civil entre pessoas do mesmo sexo e a recente resolução do CNJ atentam, elas sim, contra a laicidade do Estado. Explico.

De um lado, elas não têm assento na lei, na Lei Maior, no texto constitucional, portanto, não têm substrato jurídico. De outro, não se assentam na natureza humana, pois diz-se que o gênero é uma construção social. De outro ainda, não se assentam na soberania popular, senhora do seu destino. Assentam-se, ao revés, em princípios que, infelizmente, estão sujeitos a manipulações ou servem a construções ideológicas. Comprometem-se, portanto, tais atos com uma visão de mundo segundo a qual os homossexuais são vítimas da sociedade, e o homossexualismo é um supervalor humano.

A pergunta, pois, que não quer calar é se estado confessional é apenas aquele que professa uma fé religiosa ou se o é aquele que impõe uma ideologia oficial. Para mim, a resposta à indagação é óbvia. Não se pode proscrever uma fé oficial de cunho metafísico e tornar obrigatório um credo materialista, ainda que travestido de direitos humanos.

Outra questão que se põe é a seguinte: existe liberdade absoluta em matéria sexual? Se nenhum direito é absoluto, por que o seria o de contrair casamento contrariamente à lei natural? A sociedade inteira não tem o direito de opinar e influir nas decisões do Estado em matéria familiar? Por que razão deteria o Poder Judiciário mais legitimidade ou autoridade do que o povo, do qual se diz que o poder emana e que o exerce diretamente ou por meio de representantes eleitos, para determinar, com base em princípios de questionável conteúdo e alcance, forjados nos laboratórios da ideologia, e não em texto constitucional expresso, o desenho, a moldura, o caráter da sociedade ou entidade familiar?

A norma emanada da Resolução n.º 175 do CNJ é ato inexistente. Tanto quanto a união civil e o casamento entre pessoas do mesmo sexo, não encontra suporte no ordenamento jurídico brasileiro, no estado de direito, na soberania popular, na separação de poderes, na laicidade do Estado e no art. 226, § 3.º, da Constituição. Não vale a tinta com que foi escrita. É uma ficção e não merece cumprimento.
 

Paul Medeiros Krause
Procurador do Banco Central em Belo Horizonte

A SERPENTE E O PEDAL DE ÓRGÃO (OU O SOLO E O SUBSOLO)

O livro do Gênesis, que, como se sabe, é divinamente inspirado mas não deve ser interpretado ao pé da letra, relata que o demônio assumiu a forma de serpente para tentar nossos primeiros pais. Quando o Espírito Santo utiliza uma figura não devemos pensar que o faz à-toa, aleatoriamente. Por que não se serviu o divino autor da imagem do gambá, já que se conta que o diabo costuma anunciar sua presença por um terrível cheiro de podridão e de enxofre?

Cristo no Evangelho, em uma das suas parábolas, diz que o reino de Deus é semelhante a um grão de mostarda, que, sendo a menor das hortaliças, quando cresce se torna uma grande árvore em que os pássaros se abrigam.

O pássaro quase não toca a terra. Quando o faz, por necessidade, encosta nela tão-somente os pés, isto é, uma parte mínima do seu corpo. Quando não estão voando, as aves quase sempre estão nas árvores. Nem mesmo os seus ninhos têm contato com o solo, ficando protegidos e suspensos entre os galhos. Em grande parte do tempo, o pássaro está no ar, embora seja mais pesado que o ar. Assim também os cidadãos da cidade celeste, os filhos do reino, embora em si mesmos sejam pesados e indignos das moradas eternas, pelas asas da graça podem alcançar o céu. E os seus ninhos estão protegidos entre os ramos e a folhagem da Santa Madre Igreja.

A serpente, ao revés, é toda mundana. Arrasta-se no chão desde o começo da cabeça até o final da cauda, com todo o seu corpo. Deve ser por isto que ela não tem pés ou patas: porque quer sempre ter maior contato com o mundo. Seus ninhos também estão no solo. O horizonte da serpente e dos seus filhotes é o rasteiro, o chão, e, mesmo que não queiram, entra-lhes o pó da terra pelas narinas e pela boca. Acredito que a serpente, com os seus olhos laterais, nem sequer é capaz de olhar para o céu.

Para dizer tudo: a serpente é o animal materialista por excelência. Arrasta-se e enrosca-se em coisas palpáveis, ao passo que as aves estão suspensas em gases invisíveis, no ar. Um observador menos atento poderia dizer que as aves estão suspensas no nada. Mas isso é impossível. Sem o ar, as aves não poderiam voar.

Como a linguagem do Gênesis é figurada e Santo Agostinho diz na Cidade de Deus que algumas passagens da Sagrada Escritura comportam várias interpretações lícitas, estou pessoalmente convencido de que a serpente, a primeira e maior cientificista, na verdade, entregou a Eva não uma maçã, mas sim a primeira edição de O capital.

Depois de Memórias do Subsolo, de Dostoiévski, é difícil compreender como o marxismo sobreviveu. Difícil, mas não impossível, pois o próprio Dostoiévski explica: “o homem é a tal ponto afeiçoado ao seu sistema e à dedução abstrata que está pronto a deturpar intencionalmente a verdade, a descrer de seus olhos e seus ouvidos apenas para justificar a sua lógica”.

Em menos de uma página, talvez a mais formidável de todo o livro, Dostoiévski expõe à zombaria pública, à humilhação universal, os que pretendem construir o paraíso na terra, um palácio de cristal, com receitinhas de bolo científicas ou filosóficas. Profundo conhecedor da natureza humana, especialmente depois de ter ido ao inferno e voltado, sua crítica ao determinismo e ao cientificismo é mordaz e fatal:

“Mais ainda: então, dizeis, a própria ciência há de ensinar ao homem (embora isto seja, a meu ver, um luxo) que, na realidade, ele não tem vontade nem caprichos, e que nunca os teve, e que ele próprio não passa de tecla de piano ou de um pedal de órgão; e que, antes de mais nada, existem no mundo as leis da natureza, de modo que tudo o que ele faz não acontece por sua vontade, mas espontaneamente, de acordo com as leis da natureza. Consequentemente, basta descobrir essas leis e o homem não responderá mais pelas suas ações, e sua vida se tornará extremamente fácil. Todos os atos humanos serão calculados, está claro, de acordo com essas leis, matematicamente, como uma espécie de tábua de logaritmos...”

Decerto, essa eloquente figura da tecla de piano ou pedal de órgão tocados pelas leis da natureza, como se o ser humano não fosse dotado de liberdade e de vontade, é uma punhalada no peito das correntes de pensamento deterministas e cientificistas, dentre as quais se insere o marxismo, que atribui toda a culpa da injustiça ao sistema, ignorando a autonomia do indivíduo.

Com uma lucidez e sarcasmo ferozes, arremata o grande autor russo:

“Realmente, eu, por exemplo, não me espantaria nem um pouco se, de repente, em meio a toda a sensatez futura, surgisse algum cavalheiro de fisionomia pouco nobre, ou melhor, retrógrada e zombeteira, e pusesse as mãos na cintura, dizendo a todos nós: pois bem, meus senhores, não será melhor dar um pontapé em toda esta sensatez unicamente a fim de que todos esses logaritmos vão para o diabo, e para que possamos mais uma vez viver de acordo com a nossa estúpida vontade?!”
 
Sim, caro leitor. O homem é mais do que um pedal de órgão, do que uma tecla de piano. É ele quem toca o órgão, quem toca o piano. Mesmo diante das circunstâncias mais adversas, das situações menos prováveis, a sua decisão, a sua conduta, pode ser de todas a menos esperada, a menos prevista. A verdadeira liberdade do homem é interior, como bem compreendeu Viktor Frankl, que também esteve no inferno e saiu dele, o campo de concentração.

Mas como esperar que entendam isso cientistas, filósofos e pensadores que rastejam entre a materialidade das coisas, entorpecendo-se com a poeira do toque dos sentidos e enxergando o homem apenas como um amontoado de carne que se move? A liberdade não está na carne, meus senhores; está na alma. Quem duvida da existência da alma, como sustentará a existência da liberdade? Afinal, a alma do homem é livre até para descrer de si mesma, até para negar a verdade.
 
Paul Medeiros Krause

SONHO DE UMA TARDE DE VERÃO (GUSTAVO CORÇÃO)

Entrei na papelaria-livraria perto do Largo do Machado para comprar um caderno de papel quadriculado para os meus esquemas e uma resma de papel sem pauta para as crônicas e os ensaios (por onde se vê que o pensamento mais solto e mais leve não gosta de papel cartesiano) e ia dirigir-me ao rapaz verde e triste que gastava vida atrás do balcão, quando um cavalheiro passou-me à frente e perguntou:

-- O senhor tem o 'Como evitar preocupações'?

O moço verde respondeu que não tinha, com a mesma desatenção e a mesma voz incolor que teria para quem lhe perguntasse se já chegara a última remessa de pedras filosofais ou se estava à venda a espada do rei Artur. 
Não, não tinha o 'Como evitar preocupações'. Tratava-se evidentemente de um livro, e enquanto o pobre homem foi-se embora com mais esta preocupação de achar o livro, fiquei eu parado, esquecido de minhas encomendas, a pensar na síntese de gaiatice que é a humanidade. Já vi livros de 'Como fazer amigos' ou 'Como evitar resfriados'. Já ouvi falar de muitos outros similares que cuidam de livrar o homem de tal ou qual aborrecimento, desde a coriza até os filhos. Nunca, entretanto, imaginara que alguém entrasse numa livraria, mormente no Largo do Machado, e com aquela confiante simplicidade, pedisse um livro para aprender a arte de evitar as preocupações.
 
Não, meu amigo, você não sabe o que é preocupação. Este peso no estômago da alma não pode existir em quem tão confiadamente acredita em livros e tão deliberadamente os procura. Faz parte da própria essência da preocupação o sentimento de não haver sedativo que a adormeça, porque no fundo todas as preocupações têm raízes na mesma chateação essencial que vem da má companhia que fazemos a nós mesmos. Em certas horas a gente tem a impressão de estar aturando o sujeito mais cacete do mundo, que entrou sem pedir licença e não parece desconfiar que as horas são intermináveis, que está fazendo calor por fora e por dentro, sim, calor, mormaço, tédio, pressão. Há diversas receitas já muito experimentadas para escapar a essa espécie de mal-estar. Foge-se pela porta dos fundos, diz-se a si mesmo que o próprio não está em casa, e vai-se para a esquina beber, jogar ou ver passar os efêmeros que nascem num alisar da porta e morrem no outro umbral. Mas cedo ou tarde, com arrependimento ou simplesmente preguiça, o fujão tem de voltar à triste companhia de si mesmo...
 
-- O senhor deseja alguma coisa? Perguntava o moço do balcão.

Ah! quem não deseja alguma coisa? Mas quem, quem entre as hierarquias dos anjos me dirá o que devo fazer nesta tarde de verão? Hein? Como? Ah! sim, eu queria um bloco de papel quadriculado e um liso. No momento todos os impulsos dos sentidos e do apetite espiritual se limitam a este modesto material de papelaria.

 
* Em "Melhores Crônicas Gustavo Corção", Editora Global.

CORAÇÃO INQUIETO

Tenho um amigo que costuma dizer: “pelo dedo se conhece o gigante”. Certamente, essa fala não é dele, mas foi da sua boca que eu a ouvi pela primeira vez. Quero tomar de empréstimo esse ditado para me referir ao começo das Confissões de Santo Agostinho. O bispo de Hipona dá início à sua autobiografia, talvez a primeira da história e criando um novo gênero literário, falando da inquietude do seu coração. Instruído pela sua própria experiência e dotado de um fino senso de observação, Aurélio Agostinho assevera que o coração humano vive inquieto enquanto não encontra o objeto desejado. Viktor Emil Frankl, o renomado psicoterapeuta austríaco, diria que o ser humano não se realiza enquanto não encontra e desenvolve o seu sentido específico.

Em um único parágrafo, Santo Agostinho resume toda a história da humanidade e toda a história das nossas vidas. Todo o drama do gênero humano, do princípio ao fim, do primeiro ao último homem, todo o drama da minha vida, da sua vida, do começo ao ocaso, está contido no parágrafo inaugural das Confissões. Que absurda concisão e penetração de espírito!
 
É incrível perceber que ainda hoje, principalmente hoje!, muitos homens procuram e não encontram. Não sabendo o que procuram, contentam-se com o que encontram. Não se conhecem e conformam-se com viver, digo, em arrastar-se pela vida, sem uma direção consistente, sem um rumo que lhes preencha o vazio. Tomo a palavra “homens” no sentido de homens e mulheres. Muitos de nós somos desonestos com nós mesmos. Muitos contentam-se com verdades provisórias, em adiar indefinidamente a solução do problema da sua existência.
 
Conheço pessoas que têm medo de enfrentar-se. Que não suportam a própria companhia. São incapazes de ficar sozinhas com a televisão desligada. Esses indivíduos precisam do barulho como de uma droga. Ligam a televisão ou o rádio desde a hora em que acordam, mesmo sem prestar a atenção neles. Só os desligam quando deitam. Não têm tempo de estar a sós consigo mesmos. O silêncio os atormenta, perturba-os, deixa-os nus. É um silêncio absolutamente vazio, acabrunhante, terrível...
 
Por que será que tantos se afundam no álcool, nas drogas, no poder, na fama, no sexo ou no culto do corpo? Simplesmente porque são fracos? Creio que não. Não é porque são fracos. É porque desistiram. Porque o seu coração suicidou, deixou de buscar o objeto desejado. Inquieto por natureza, o coração humano – obviamente, não me refiro àquele amontoado de carne de que é constituído o órgão – procura o “diacho” de alguma coisa que não encontra. Enquanto não é encontrado o amor ou a verdade definitivos, o sentido a realizar, o coração humano abraça amores provisórios – muitas vezes destrutivos! –, anestésicos, e verdades paliativas. Surge, muitas vezes, a tentação do desânimo e entra em campo o mecanismo de compensação das frustrações. Em alguns casos, ocorre o desespero. Pode parecer que o verdadeiro amor não vem, que o que pode dar-nos paz, sossego e repouso não existe. A espera é longa...
 
Calma, leitor! É preciso enfrentar o problema, o drama da nossa existência, e não fugir dele, contentando-nos com uma aspirina. Abraçar uma verdade provisória, casar-se com quem não se ama suficientemente e não nos realiza, é renunciar à felicidade completa.

Por que muitos defendem o casamento gay? Porque não se conhecem e não conhecem os outros. E, muito provavelmente, desistiram de conhecer-se e de conhecê-los. É mais fácil não ter de pensar muito. Pensar dá trabalho. Às vezes, dói. Fugir dos problemas é mais confortável do que enfrentá-los. Mas a fuga não traz paz.
 
Alguns têm uma ideia tão distorcida de si mesmos que para eles equivalem-se o ser e o não ser. Um gay que se conheça e seja honesto consigo próprio não quer ser gay. Ele sabe que existe uma verdade mais profunda sobre si mesmo e sobre o seu drama pessoal. Mas a tentação de entregar os pontos, de se deixar levar pela corrente, pela ganância midiática e pela opinião dos covardes é muito mais cômoda. Só que não traz paz. A paz é fruto da verdade.

Por que o nosso mundo é agitado e barulhento? Porque as pessoas que compõem a humanidade não encontraram o objeto desejado. Permanecem em uma busca sôfrega, trôpega, irrequieta e angustiante. A inquietação e a intranquilidade são sintomas de necessidades insatisfeitas. O primeiro passo é não tentar se enganar. É a honestidade para com a nossa consciência, para com os nossos anseios e talentos. É indispensável que não se troquem objetivos mais altos por finalidades mesquinhas.
 
Não nos contentemos, pois, com a inquietude. Não renunciemos à busca. O objeto dos nossos amores está à nossa espera. Santo Agostinho dá-nos uma boa pista, ele que percorreu esse caminho. A esposa dos nossos sonhos existe. Não nos comprometamos com os amores da estação.

Paul Medeiros Krause