É
com muito prazer que falo de Dom Cristiano. Ele foi uma espécie de pai para mim
por mais de uma década.
Conheci-o
por intermédio de uma pessoa amiga, muito da minha confiança. Tal pessoa, a
quem eu pedi licença para falar sobre o assunto, chegou a Dom Cristiano por
causa de um sonho que tinha a aparência de coisa sobrenatural. Essa pessoa,
tendo conversado com o seu pároco e com uma senhora da sua paróquia que dava
atendimento e aconselhamento, recebeu dessa senhora o seguinte conselho: “Tudo
o que sei sobre esse tipo de coisa eu lhe disse. Para saber mais, vá conversar
com um bispo emérito chamado Dom Cristiano, que é capelão do Hospital Madre
Teresa. Ele entende totalmente desse tipo de assunto. Ele possui todos os dons
do Espírito Santo.”
Essa
pessoa então procurou Dom Cristiano e marcou com ele um horário para conversar.
Para sua surpresa, quando Dom Cristiano a recebeu, conta ela, ele adivinhou
coisas a seu respeito, coisas sobre a sua família, relações de parentesco e
profissão. Prefiro não entrar em mais detalhes, mas essa pessoa disse-me que
ele realmente demonstrou ter total domínio do assunto espiritual do
qual ela foi tratar, parecia mesmo saber exatamente tudo o que ocorreu mesmo
antes de ela contar, limitando-se, porém, a dizer: “Foi de Deus”, talvez para
não despertar nela a vaidade ou curiosidade.
Tendo
essa pessoa me contado o acontecido, passei a ir confessar-me com frequência
com ele. Inicialmente, ia uma vez por mês com a minha mãe, enquanto
estava no segundo grau. Depois que tirei a carteira de motorista, já na
universidade, ia até lá quase semanalmente. Geralmente, encontrava-me com ele
nos sábados ou domingos pela manhã.
O
que sempre me impressionou nele era a sua ortodoxia, fidelidade ao
magistério da Igreja, profunda, intensa e extensa vida de oração. Certamente,
tinha grande cultura, mas parecia escondê-la. Suas mãos estavam sempre frias,
talvez por sempre tomar banho gelado (ouvi alguém dizer que ele fazia isso. Não
posso afirmar).
Eu
gostava também de assistir às suas Missas, na minha opinião, talvez
as melhores de Belo Horizonte embora não fosse muito frequentada. Antes das
Missas, ele estava sempre sentado, já com os paramentos, no confessionário da
Capela do Hospital Madre Teresa. Após elas, sempre fazia uma ação de
graças bastante demorada no genuflexório da mesma capela.
Suas
homilias, proferidas de forma simples, não escondiam totalmente o seu grande
conhecimento das coisas de Deus, sua grande inteligência e, por que não dizer,
seu espírito prático. Ele procurava recomendar ações concretas, tirar lições de
vida objetivas, das celebrações. Todo final de homilia possuía recomendações
práticas, concretas.
Pode
ser que eu esteja superdimensionando a influência de Dom Cristiano sobre a
arquidiocese de Belo Horizonte, mas, sendo completamente honesto, eu o enxergo
quase que como um anjo da guarda, um guardião da arquidiocese. Pelas amizades
que ele tinha com Dom Sigaud, Dom João Resende Costa, outros sacerdotes e
bispos, parecia-me que ele exercia grande e silenciosa influência, que sua
palavra e seus conselhos tinham grande peso, que ele detinha grande força moral
perante o clero de Belo Horizonte. Mas, certamente, sobre isso, outras pessoas
estarão em melhores condições de opinar. Recordo-me, porém, com muita clareza de um artigo sobre ele do saudoso Padre Paschoal Rangel, no jornal "O Lutador". O artigo, feito por ocasião da morte do santo bispo, intitulava-se: "Ao mestre, com carinho". Nele, o Padre Paschoal afirmava que poucas vezes na vida tinha tido tanto a sensação de estar perto de um santo (como quando ao se encontrar com Dom Cristiano). "Santo mesmo. Canonizável!" - dizia.
O
que posso dizer mais de Dom Cristiano é que ele sempre me tratou paternalmente
e, de uma certa forma, como São Rafael livrando Tobias dos perigos da viagem,
ele me preservou de grandes perigos, pecados e desvios da adolescência e início
da juventude. Foi ele meu companheiro e proteção na juventude, conduzindo-me
são e salvo à fase adulta, quando faleceu.
Algumas
coisas mais gostaria de destacar a respeito dele. Quando a sua saúde começou a
declinar de forma definitiva, por não ter conseguido marcar uma confissão com
ele pelo telefone, fui ao Hospital Madre Teresa mesmo sem telefonar. Eu não
sabia, mas ele não estava em sua casa contígua à capela, mas em um quarto do
hospital. Descobri qual era o quarto e fui vê-lo. Se a memória não me trai – às
vezes, confundimos e fantasiamos algumas coisas –, ele usava uma máscara de
oxigênio, embora plenamente consciente. Ele estava no leito, deitado. Quando me
viu, mesmo deitado e com a máscara – o leitor me perdoe se não havia máscara,
minha memória me diz que havia –, disse-me: “Ô, meu filho! Você veio se
confessar?”, demonstrando paternal solicitude e estar inteiramente pronto e
disponível para me atender em confissão mesmo com a máscara e deitado no leito
do hospital. Eu realmente tinha ido ao hospital com a intenção de confessar-me,
mas é claro que não tive coragem de dizer isso a ele. Respondi-lhe: “Não, Dom
Cristiano, vim apenas ver o senhor”. Em todo o caso, não deixo de imaginar a
beleza e grandeza desse quadro: confessar-me com um sacerdote, com um bispo
emérito, já próximo da morte, com máscara de oxigênio e deitado no leito do
qual não mais se levantaria. Sim, talvez Dom Cristiano tivesse o sonho de
morrer atendendo confissão, administrando os sacramentos, a misericórdia
divina, gastando-se e desgastando-se inteiramente por Cristo. Afinal, o seu
lema era “apóstolo do amor de Cristo”.
Devo
acrescentar ainda que a ele e a Dom Bosco recorro nas minhas angústias,
desesperos e necessidades mais prementes. Naqueles três ou quatro momentos
raros e cruciais da nossa vida nos quais não sabemos mais o que fazer e a quem
recorrer, eu recorri a ele e a Dom Bosco. Em dois deles, levei um quadro do primeiro,
que eu tinha na sala, para o meu quarto. O problema foi solucionado, de forma
totalmente inesperada, no dia seguinte. Não digo que em todas as quatro vezes,
mas pelo menos em duas. E, nas outras duas, também fui atendido, embora a solução
dos casos tenha exigido mais tempo. Num desses casos em que a graça levou mais
tempo – tratava-se de conseguir a aprovação em um concurso público –, na
véspera de uma prova para promotor de justiça em Minas Gerais, tive um sonho em
que ele me disse: “Meu filho, eu quero que você estude muito.” Não passei no
concurso de promotor e não sei se foi algo real, mas o sonho me deu um certo ânimo ou entusiasmo para
continuar estudando para outros concursos.
Por
último, quero relatar um outro episódio interessante. Em uma noite tive vontade
de conversar com a alma dele e de dizer-lhe: “Se o senhor for santo – perdoe-me
a franqueza, via algumas limitações no senhor, na minha opinião o senhor não
era, mas a lógica de Deus não é a minha! – e quiser ser canonizado, peça-me o
que o senhor quiser e eu farei tudo o que estiver ao meu alcance para
consegui-lo! É o mínimo que eu posso fazer pelo senhor para demonstrar-lhe a
minha gratidão.” Pois bem. No dia seguinte, abro minha caixa de e-mails e está
lá um e-mail de uma pessoa que era muito próxima a ele, pedindo uma grande
ajuda, não exatamente para si, mas para uma terceira pessoa. Respondi a ela:
“Conte comigo. Vou lhe prestar essa ajuda. Mas não pense que sou eu quem a está
ajudando. Considere essa ajuda vinda diretamente das mãos do Dom Cristiano”.
Paul Medeiros Krause
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